quarta-feira, 25 de março de 2015

Senhor Obama, ainda está em tempo de reconstruir o Oriente Médio

Numa carta aberta ao presidente dos Estados Unidos, uma liderança palestina exorta os Estados Unidos a intensificar os esforços de paz após a reeleição israelense de Benjamin Netanyahu. A carta foi publica originalmente no jornal britânico The Independent no domingo de 22 de março de 2015 sob o título de “Mr. Obama, there is still  time to remake the Middle East”.


Obama e Netanyahu




Caro Senhor Presidente,


A América é uma sociedade fascinante. É uma nação de nações: o mundo em miniatura. Cada continente, cada cultura e civilização está representada dentro de suas fileiras.


Em nosso mundo unipolar, o não alinhamento não é mais a opção política dos países do Terceiro Mundo que temiam uma colisão ou conluio das duas superpotências rivais. Em contrapartida, isso é que deve caracterizar a política externa americana. Porque se os EUA se alinham com um protagonista beligerante num conflito regional, isso não só aliena e antagoniza desnecessariamente todos os demais países na área, mas também ofende e marginaliza um componente doméstico de seu próprio tecido nacional e social.


Uma recente pesquisa mostrou que 66 por cento dos americanos queriam neutralidade dos EUA no conflito israelense-palestino.

Sr. Presidente,


No circuito de palestras nos Estados Unidos, fui muitas vezes interpelado sobre os meus sentimentos relativos à sua candidatura à Casa Branca. Minha resposta habitual era: “Como um diplomata estrangeiro, devo me abster de opinar sobre assuntos internos americanos, mas minha esposa acredita que Barak Obama está reavivando o idealismo americano e é o único candidato capaz de conciliar a América consigo mesma e com o mundo”.


Depois de vários começos promissores de sua parte, especialmente o discurso no Cairo acerca da abertura de um novo capítulo nas relações americano-árabes e americano-muçulmanas, é de conhecimento público que Netanyahu disse ao seu círculo mais próximo, à véspera de uma de suas visitas aos EUA: “Sou mais forte do que esse homem em Washington, DC”. Em seus reiterados confrontos de vontades, Netanyahu inegavelmente vem levando a melhor. Comentaristas escreveram que ele deu um tiro no próprio pé, mas, até agora, isso não parece tê-lo afetado.


Na semana passada, as eleições israelenses para o Parlamento foram reveladoras.  Pública e categoricamente, Netanyahu rejeitou não só um estado palestino, mas eleitores palestinos. Para ele, somos uma ameaça tanto como nação quanto como indivíduos. 


O lado palestino e árabe tem sido o que denomino de “irracionalmente racional” em sua busca por um acordo negociado. Eles não ameaçam mais a existência de Israel, apenas questionam sua expansão. Hoje, todavia, não se pode deixar de concluir que aquilo que é democraticamente aceitável para um lado, é totalmente inaceitável para o outro. E talvez resida nisso a maior falha no processo de paz como foi coreografado até agora. Coisas demais foram deixadas para os beligerantes locais resolver.


O lado palestino negociou à mercê de um equilíbrio desconfortável de forças, pois o processo permaneceu refém das políticas domésticas israelenses. Israel era constantemente inclinado a ditar o limite do possível e do aceitável. A opinião pública israelense queria um resultado diplomático que refletisse a intransigência israelense, o alinhamento americano com Israel, o declínio russo, a abdicação europeia, a impotência árabe e o que eles esperavam que fosse a resignação palestina.


Os últimos 24 anos de pacificação teórica não foram anos de retiradas territoriais israelenses, mas anos nos quais testemunhamos a expansão da ocupação por meio do crescimento dos assentamentos ilegais. O impasse diplomático hoje não é devido a uma rejeição árabe da existência de Israel, mas precisamente da rejeição por parte de Israel da sua própria aceitação pelos árabes. Especificamente, Israel persiste em sua recusa a renunciar à aquisição territorial feita em 1967.


Sr. Presidente, ante as decepções acumuladas nos últimos seis anos, permita-me partilhar com o senhor três observações as quais, acredito, podem ser úteis no planejamento do caminho futuro:


Primeiro, o senhor não parece ter se dado conta da mudança verificada no centro de gravidade dentro da comunidade judaica americana. Ela percebe cada vez mais as políticas e as práticas israelenses como uma fonte de constrangimento para uma comunidade de americanos que se acostumaram a ser a vanguarda dos direitos humanos e civis. Relegada, devido a sua ligação com Israel, a defender o indefensável, essa comunidade sente muito desconforto com as escolhas feitas por Israel e consideraria bem-vinda uma abordagem mais assertiva por parte dos EUA.


Em segundo, ao contrário do seu irritante antecessor, um unilateralista impenitente, o senhor é autêntica e genuinamente um multilateralista. Mesmo assim, o senhor tem feito um uso insuficiente de seus parceiros europeus e internacionais para se contrapor às pressões domésticas. A Europa é ainda um ator em busca de um papel. Nós, no Oriente Médio, temos um papel à procura de um ator. É interesse de todos se afastar da impotência autoinfligida dos atores externos.


Terceiro – e até agora, Sr. Presidente – o senhor não demonstrou coragem para corresponder à audácia dos cidadãos americanos que ousaram, contra todas as probabilidades e preconceitos, votar no senhor para o cargo. Não apenas uma, mas duas vezes. Sucessivas administrações americanas têm dito que um estado palestino está no interesse nacional americano; que a América está comprometida com a existência de Israel, mas não com sua expansão; que o problema irresoluto palestino é prejudicial aos interesses dos EUA e é um agente importante de recrutamento para movimentos extremistas. Netanyahu teimosamente quer projetar a imagem de um conluio americano-israelense para manter os EUA em curso de colisão com o mundo árabe-islâmico.


Sr. Presidente, suspeito que o senhor ficará surpreso com o massivo apoio que lhe será dado, tanto interna, quanto internacionalmente, se o senhor vincular a ajuda dos EUA a Israel ao aconselhamento americano. Resumindo: se o senhor quiser reconciliar o poder americano com os princípios americanos. Responder ao clamor palestino por liberdade, ou seja, fim da ocupação e servidão, é crucial para a credibilidade, respeitabilidade e – ouso dizer - amabilidade dos EUA. 


Com um simples telefonema, em 1956, o presidente Eisenhower conseguiu que David Ben Gurion se retirasse do Sinai ocupado – e durante um ano de campanha presidencial. Comparado a Ben Gurion, Netanyahu parece um cordeiro.


Temos ainda mais dois anos. Se a vontade internacional tiver primazia sobre o capricho nacional israelense, um território que foi ocupado em seis dias, em 1967, pode também ser evacuado em seis dias, de forma que os israelenses possam descansar no sétimo, e nós poderemos finalmente nos lançar na fascinante jornada da construção do estado e da recuperação econômica.

Poderemos realmente testemunhar um outro momento Eisenhower? Sim, Sr. Presidente, acredito que poderemos.



Respeitosamente,


Afif Emile Safieh.



Afif Emile Safieh é Embaixador Palestino Itinerante para Missões Especiais e antigo chefe da missão diplomática palestina em Londres, Washington e Moscou.


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Veja as ultimas publicações:


Mar 2015



Fev 2015


Jan 2015






Dez 2014




 

segunda-feira, 23 de março de 2015

A esquerda, o sionismo e a tragédia do povo palestino

Publicado pelo Blog da Boitempo

Muro do Apartheid e da Vergonha construido por Israel


Por Domenico Losurdo.*


 Apresentação do Boitempo sobre o artigo: 


Em um contexto de mobilização internacional em torno do massacre em Gaza, da proliferação do debate sobre o conflito no Oriente Médio o Blog da Boitempo recupera um artigo de Domenico Losurdo, publicado originalmente na revista italiana L’ERNESTO, em 2001. Nele, o historiador italiano defende a necessidade de a esquerda tomar uma posição em relação ao sionismo, rejeitando as análises que apontam para a “complexidade” desse movimento, esquivando-se de emitir um julgamento sobre ele. Traçando um panorama histórico e conceitual, o autor insiste que a esquerda deve denunciar o colonialismo sionista e suas práticas racistas, recusando a equiparação entre anti-sionismo e anti-semitismo. 

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Os “escravos enfurecidos” e o sermão da “complexidade”

Em Durban, por ocasião da Conferência internacional sobre racismo promovida pela ONU, três mil organizações não governamentais provenientes de todo o mundo condenaram com palavras candentes Israel por causa da opressão nacional e da discriminação infligidas aos palestinos, da ferocidade de uma repressão militar que não se detém nem mesmo diante de “atos de genocídio”.

Mais timidamente agiram as delegações oficiais. A perseverante cumplicidade da União Européia para com Israel privou o documento final de muito de sua força. E, contudo, talvez pela primeira vez na história, o Ocidente capitalista e imperialista foi obrigado de modo tão solene a sentar-se no banco dos acusados, foi posto com força diante de algumas páginas de sua história, constantemente recalcadas, que vão do tráfico dos escravos negros ao martírio do povo palestino. A fuga indecorosa das delegações norte-americana e israelense selou o ulterior isolamento daqueles que hoje são os responsáveis de crimes horríveis contra a humanidade e os piores inimigos dos direitos do homem. Trata-se de um resultado de importância extraordinária. E, contudo, até mesmo à esquerda não faltaram aqueles que torceram o nariz. Dando-se ares professorais em relação aos palestinos, convidaram-nos a moderar o tom: sim, a crítica a Israel pode ser justa, mas por que trazer à discussão o sionismo e por que acusá-lo até de racismo?

Em seu tempo, Fichte, troçando da leviandade de certos discursos relativos aos “excessos” da Revolução francesa, exprimiu o seu desprezo por aqueles que, estando em segurança e continuando a gozar de todas as comodidades da vida, pretendem pregar a moral aos “escravos enfurecidos” e decididos a tirar dos ombros a opressão. Não contentes com a lição de moral, os atuais professores do povo palestino pretendem também dar uma lição de epistemologia: pôr em acusação o sionismo enquanto tal – eles sentenciam – significa perder de vista a “complexidade” deste movimento político, caracterizado pela presença no seu interior de correntes muito diversas entre si, de direita, de esquerda e até mesmo de uma esquerda de orientação socialista e revolucionária.

Na realidade, a se seguir de maneira coerente a metodologia aqui sugerida, não é somente com relação ao sionismo que seremos obrigados a calar. Em 1915, a intervenção da Itália no primeiro conflito mundial foi por alguns círculos reivindicada com palavras de ordem explicitamente expansionistas e imperialistas, por outros como uma contribuição à causa do triunfo da democracia e da paz a nível mundial. Mas, pelo menos para os comunistas, não deveria haver dúvidas sobre o fato de que se tratava de uma guerra imperialista em todos os sentidos, não obstante as boas intenções e a sinceridade democrática e até mesmo revolucionária dos seguidores do “intervencionismo democrático”.

Sirvamo-nos de outro exemplo. Não há dúvida de que o colonialismo em certos casos assumiu um caráter explicitamente exterminador (que se pense em particular no nazismo, mas também, anteriormente, aos que fizeram os aborígines australianos e outros grupos étnicos desaparecer da face da terra), ao passo que outras vezes deteve-se no limiar do genocídio. No fim do século XIX a expansão colonial do Ocidente na África desenvolveu-se agitando a palavra de ordem da libertação dos escravos negros, enquanto alguns decênios mais tarde Hitler promove a colonização da Europa oriental com o objetivo declarado de obter a massa de escravos de que necessita a “raça dos senhores” arianos. Se o Terceiro Reich, no curso de sua marcha expansionista, enaltece as virtudes purificadoras e regeneradoras da guerra, o colonialismo, em certos momentos de sua história (por ocasião da sanguinária expedição conjunta das grandes potências para a repressão da revolta dos Boxers na China), não hesitou em se auto-celebrar por sua contribuição decisiva para a causa da paz perpétua¹.

Seria errado ignorar aqui a “complexidade” do fenômeno histórico em exame e suas diferenças internas, as quais, contudo, não nos podem impedir de pronunciar um juízo sobre o colonialismo enquanto tal: mesmo no caráter múltiplo e matizado das suas manifestações, o colonialismo é sinônimo de pilhagem e de exploração, e implicou em guerra, em agressão e na imposição em larga escala de formas de trabalho forçado em dano das populações coloniais, mesmo quando se declarou movido pelo intento humanitário de promover a realização da paz perpétua e a abolição da escravidão, e mesmo quando alguns expoentes políticos ou alguns ideólogos das grandes potências do Ocidente acreditaram sinceramente em tais boas intenções!



Sionismo e colonialismo

Não escolhi por acaso o exemplo do colonialismo. Uma pergunta logo se impõe: existe alguma relação entre sionismo e colonialismo? Não há dúvida de que o sionismo, mesmo na multiplicidade dos seus componentes, se caracteriza por uma palavra de ordem inequívoca: “uma terra sem povo para um povo sem terra”! Estamos em presença da ideologia clássica da tradição colonial, que sempre considerou res nullius, terra de ninguém, os territórios conquistados ou cobiçados e sempre teve a tendência a reduzir a uma grandeza insignificante as populações indígenas. Ademais da ideologia, o sionismo toma de empréstimo da tradição colonial as práticas de discriminação e opressão. Bem antes da fundação do Estado de Israel, já no curso da Segunda Guerra mundial, quando se estabelecem na Palestina os sionistas programam a deportação dos árabes. “Deve ficar claro que não há lugar para todos os dois povos neste país”; faz-se necessário “transferir os árabes para os países confinantes, transferi-los todos”: inequívoco é o programa enunciado no final de 1940 por um dirigente de primeiro plano do movimento sionista.

Sobre isso chama a atenção Edward W. Said2; e se o iminente intelectual palestino devesse resultar suspeito, tenha-se presente que, em outubro de 1945, Hannah Arendt condena com veemência os planos – que, no entanto, depois do fim da Segunda Guerra mundial, se tornaram muito concretos – de “transferência dos árabes da Palestina para o Iraque”3. Aqui, com um gracioso eufemismo, fala-se de “transferência” ao invés de deportação. Mas, três anos depois, Arendt descreve de modo preciso a violência terrorista desencadeada contra a população árabe. Eis a sorte reservada a Deir Yassin:

“Esta aldeia isolada e circundada de território hebraico não tinha participado da guerra e havia até mesmo proibido o acesso a bandos árabes que queriam utilizar a aldeia como ponto de apoio. No dia 9 de abril [1948], segundo o New York Times, bandos terroristas [sionistas] atacam a aldeia, que no decorrer dos combates não representava nenhum objetivo militar, e matam a maioria da sua população – 240 homens, mulheres e crianças; deixam uns poucos com vida para fazê-los desfilar como prisioneiros em Jerusalém”.

Não obstante a indignação da grande maioria da população judaica, “os terroristas se orgulham do massacre, tratam de lhe dar ampla publicidade convidando todos os correspondentes estrangeiros presentes no país para verem os montes de cadáveres e a devastação generalizada em Deir Yassin”4.

Não há dúvida: nem todos os componentes e os membros individuais do movimento sionista se comportam dessa maneira, e seja como for a promover a fundação do Estado de Israel estão também sionistas com uma longa história de esquerda às costas; mas nenhum comunista, bem como nenhum democrata, pensaria em justificar o comportamento da social-democracia alemã, por ocasião do início e no curso da primeira guerra mundial, com o argumento das grandes lutas populares conduzidas por esse partido no passado e do prestígio internacional por esse modo acumulado.

De resto, olhemos mais de perto a esquerda sionista, fiando-nos ainda na análise e no testemunho de Arendt. Também ela faz referência ao “movimento nacional judaico social-revolucionário”, e eis como o caracteriza: trata-se de círculos certamente empenhados no prosseguimento de experiências coletivistas e de uma “rigorosa realização da justiça social no interior de seu pequeno círculo”, mas, quanto ao resto, prontos a apoiar os objetivos “chauvinistas”. No conjunto estamos em presença de um “conglomerado absolutamente paradoxal de tentativas radicais e reformas sociais revolucionárias em política interna, e de métodos antiquados e totalmente reacionários em política externa, ou seja, no campo das relações entre judeus e outros povos e nações”5.

No decorrer de sua história, o movimento comunista sempre se recusou a considerar de esquerda esse “conglomerado”, taxando-o sempre com o nome de social-chauvinismo. Tão pouco de esquerda é esse entrelaçamento de expansionismo (em dano dos povos coloniais) e de espírito comunitário (chamado para cimentar o povo dominante empenhado numa difícil experiência de guerra), que uma grande personalidade judaica chega a ver nele até mesmo um dos motivos de semelhança entre sionismo e nazismo 6.

Sionismo e racismo


Chegamos, assim, ao ponto crucial. Aos hipócritas que se escandalizam com as acusações de racismo dirigidas ao sionismo, pode-se contrapor o exemplo de laicismo e de coragem intelectual de Victor Klemperer, acima citado. Quando obrigado a se esconder para escapar à perseguição e à “solução final” que o Terceiro Reich reservou aos judeus, ele não hesita em falar, a propósito dos escritos e da ideologia de Herzl, de “extraordinário parentesco com o hitlerismo”, de “profunda comunhão com o hitlerismo”. Pode-se talvez chegar a uma conclusão ainda mais radical: “A doutrina da raça de Herzl é a fonte dos nazistas; são estes que copiam o sionismo, não vice-versa”.

Na associação entre nazismo e sionismo temos todavia um “enfático norte-americanismo”, ou seja, o mito de um Far West a ser colonizado, de um território virgem que o Terceiro Reich procura na Europa oriental e o sionismo na Palestina. Não é o próprio Herzl que remete de maneira explícita ao modelo do Far West? O único esclarecimento é que os sionistas pretendem proceder a uma “tomada de posse da terra” que não deixe nada à improvisação 7. A conclusões não muito diversas daquelas de Klemperer, chega Hannah Arendt. De estímulo para a chacina de Deir Yassin houve uma mistura explosiva de “ultranacionalismo”, “misticismo religioso” e pretensão de “superioridade racial”.

Assumindo “a linguagem dos nacionalistas mais radicais”, o sionismo configura-se de maneira explícita como “pan-semitismo”8; mas por que razão o pan-semitismo deveria ser melhor do que o pan-germanismo? Herzl está obcecado pela preocupação de manter firme a identidade cultural e étnica do judaísmo: não declara ele mesmo que o sionismo deverá procurar os seus “aliados” e os seus “amigos mais devotos” entre os anti-semitas, eles mesmos desejosos de evitar contaminações entre povos diversos na sua alma e na sua essência9? A partir disso Arendt chega a uma conclusão radical: o sionismo “não é mais que a aceitação acrítica do nacionalismo de inspiração alemã”. Ele assimila as nações a “organismos biológicos superhumanos”; mas também para Herzl “não existiam mais do que agregados sempre iguais de pessoas, vistas como organismos biológicos misteriosamente dotados de vida eterna”10. E, novamente, remetendo ao “nacionalismo de inspiração alemã”, cheio de motivos “biológicos”, somos reconduzidos ao nazismo ou, pelo menos, à ideologia sucessivamente herdada e radicalizada pelo Terceiro Reich.

Utilizei até agora os artigos e as intervenções de Arendt anteriores à sua virada anticomunista e antimarxista ocorrida com a eclosão da guerra fria. Mas é interessante notar que, ainda em 1963, a filosofa não perdeu nada de sua carga desmistificadora. Por ocasião do processo Eichmann, “o ministério público denunciou as infames leis de Nuremberg de 1935, que tinham proibido os matrimônios mistos e as relações sexuais de judeus com alemães”. Contudo, no próprio momento em que foi pronunciado esse requisitório, em Israel tinha vigência uma legislação análoga, de modo que “um judeu não pode casar com um não judeu”. E não é tudo. A “lei rabínica” comporta toda uma série de discriminações de base étnica: “Os filhos nascidos de matrimônios mistos são, por lei, bastardos (os filhos nascidos de pais judeus fora do vínculo matrimonial são legitimados), e se alguém tem por acaso uma mãe não-judia, não pode se casar e não tem direito ao funeral”. Sobretudo, Arendt chama a atenção sobre o entusiasmo suscitado, no seu tempo, no criminoso nazista pelas teses expressas por Herzl no seu livro O Estado judeu: “Depois da leitura deste famoso clássico sionista, Eichmann aderiu prontamente e para sempre às ideias sionistas”11.

Talvez, nesse caso, em Klemperer e na própria Arendt, mais que uma exasperação polêmica, há um real excesso de simplificação: é difícil atribuir ao sionismo as ambições de domínio planetário e de inversão radical em sentido reacionário do curso da história que desempenham um papel central na ideologia e no programa político de Hitler; além do mais não existe equivalência entre racismo e contra-racismo (ou seja, racismo de reação). Mais equilibrada, revela-se uma outra eminente personalidade judaica, o historiador George L. Mosse, o qual, aliás, também chama a atenção para o fato de que o sionismo pensa a “nação judaica” nos termos naturalistas propagados pelos turvos “ideais neogermânicos”, que se difundem a partir do fim do século XIX, desempenhando um papel não insignificante no processo de preparação ideológica do Terceiro Reich12. Sobre isso será preciso continuar a raciocinar e a discutir, mas os gritos escandalizados surgidos por ocasião da Conferência de Durban querem justamente impedir o raciocínio e a discussão.

Contudo, pelo menos um ponto resulta agora suficientemente claro. Sobre a abertura concreta do sionismo, sobre as relações sociais e “raciais” vigentes atualmente em Israel, damos a palavra a judeus de orientação democrática, esclarecendo que não se trata de nenhum modo de extremistas, dado que publicam as suas intervenções no International Herald Tribune. Pois bem, aqui podemos ler que, ainda que uma democracia, Israel é uma “democracia de casta segundo o modelo da antiga Atenas” (que por fundamento tinha a escravidão dos bárbaros), ou seja, segundo o modelo do “Sul dos USA” nos anos da discriminação racial contra os negros.

O quadro que Israel apresenta é claro: “A sua minoria de árabes israelenses vota, mas tem um estatuto de segunda classe sob muitos outros aspectos. Os árabes, sob seu governo na Cisjordânia ocupada, não votam e estão privados quase de todo direito”13. A prática da discriminação contra os palestinos caminha pari passo com a sua “desumanização”14. É um dado de fato: nos territórios de uma maneira ou de outra controlados por Israel, o acesso à terra, à educação, à água, a liberdade de movimento, o gozo dos direitos civis mais elementares, tudo depende do pertencimento étnico. Somente os palestinos correm o risco de ter a propriedade destruída, de serem deportados, de serem torturados (mesmo os que ainda são menores de idade), de serem entregues aos esquadrões da morte: e, tudo isso, não na base em uma sentença da magistratura, mas na base no arbítrio das autoridades policiais e militares, ou seja, sob a decisão soberana do Primeiro ministro. Sharon “fala ainda com orgulho da sua dura campanha contra os militantes palestinos em Gaza trinta anos atrás, quando destruía com tratores as casas e deportava os pais dos adolescentes envolvidos nos protestos”15. Assim, como no-lo informa a imprensa norte-americana, é possível ser deportado não somente com base em uma suspeita, mas também a partir de vínculos de parentesco com um jovem suspeito de ter lançado uma pedra contra um soldado israelense. E corre-se este risco sempre e somente sendo palestino.

Não é racismo tudo isso? Por outro lado, enquanto rejeita com horror a reivindicação dos refugiados palestinos de retorno à terra da qual foram expulsos pela violência, Israel convida os judeus de todo o mundo a se estabelecerem no Estado judeu e encoraja a colonização dos territórios ocupados, dos quais os palestinos continuam a serem expulsos. O que é isso senão limpeza étnica?

As árvores e a floresta


Diante da terrível evidência da realidade, como parecem retrógrados os apelos que uma certa esquerda dirige aos palestinos e árabes para que não se ocupem de problemas muito “complexos” como o sionismo e o racismo de Israel, concentrando se ao invés disso na crítica ou na condenação de Sharon [ou de Netanyahu]! Mas, por parte da esquerda ocidental, esta condenação está pelo menos à altura da situação? No fim de 1948, por ocasião da visita de Begin aos EUA, Arendt apelava à mobilização contra o responsável pela chacina de Deir Yassin, fazendo notar que o partido por ele dirigido resultava “estreitamente aparentado com os partidos nacional-socialistas e fascistas”16. Por que a esquerda ocidental não ousa exprimir-se com a mesma clareza com relação ao responsável pelo massacre de Sabra e Chatila? Além do mais, ainda que a condenação de Sharon estivesse à altura dos crimes, nem por isso o assunto poder-se-ia considerar encerrado.

Com a mesma lógica, com a qual uma certa esquerda convida a deixar de lado a questão do racismo de Israel e do papel do sionismo, poderíamos nos perguntar: por que não se limitar à denúncia do governo de Berlusconi (ou dos precedentes governos Amato e D’Alema) ao invés de criticar o capitalismo? E por que não centrar fogo sobre Bush filho (ou sobre Clinton ou sobre Bush pai) ao invés de trazer à discussão o imperialismo? É a lógica dos reformistas mais medíocres e mais miúdos: estão dispostos – bondade deles – a dar uma olhada nessa ou naquela árvore, mas ai de você se lhes acenar para a existência de uma floresta! Contudo, se não se olha para a floresta será impossível não só resolver positivamente a tragédia do povo palestino, como também analisá-la de modo adequado.

Esta tragédia não teve início com [Netanyahu], Sharon, ou com Barak, e nem mesmo com os governos anteriores. De “injustiça perpetrada contra os árabes”, Arendt17 fala já em 1946, e nessa mesma circunstância afirma que a fundação de Israel “tem pouco a ver com uma resposta aos anti-semitas”. Com efeito, basta folhear ainda que rapidamente Herzl, para dar-se conta que para ele a contradição principal é a que contrapõe os “judeus fiéis à estirpe” aos judeus “assimilados”, acusados de fazer o jogo de quantos gostariam do “ocaso dos judeus mediante miscigenação” e de praticar matrimônios mistos (onde por matrimônios mistos estão compreendidos também aqueles entre judeus convertidos e judeus “fiéis à estirpe” e à religião18).

A ferocidade do anti-semitismo (que culmina no horror de Auschwitz) tem indubitavelmente alimentado de maneira poderosa o movimento sionista, mas os seus fundadores sempre declararam de maneira aberta que a opção sionista é independente do anti-semitismo e continuaria a ser válida “ainda que o anti-semitismo desaparecesse completamente do mundo”19. Para dizê-lo com as palavras de Arendt, o sionismo está empenhado em utilizar o anti-semitismo como “o fator mais saudável da vida judaica”, como a “força motriz” primeiro da criação e depois do desenvolvimento do Estado judeu20.

Particularmente instrutiva é a recente visita de Sharon a Moscou. Ele observou o desenvolvimento na Rússia da vida cultural e religiosa da comunidade judaica: é uma espécie de “época de ouro”. Tudo bem, portanto? Ao contrário, porque o primeiro ministro israelense assim prosseguiu: “Isso me preocupa, pelo fato de que nós temos necessidade de um outro milhão de judeus russos”21. Para angustiar Sharon não está o perigo do antisemitismo, mas, pelo contrário, o da assimilação. Tornam-se agora evidentes os resultados desastrosos a que conduz a tendência a lançar o olhar às árvores tomadas isoladamente, mas desinteressando-se da floresta no seu complexo.

Critica-se a política de colonização dos territórios ocupados, mas cala-se sobre o convite aos judeus russos (ou norte-americanos ou alemães e de todo o mundo) para imigrar maciçamente a Israel: como se entre as duas coisas não houvesse nenhum nexo! Se, ao contrário, queremos captar tal nexo, devemos ousar olhar para a floresta. Esta floresta é o sionismo, o colonialismo sionista, com as práticas racistas que toda forma de colonialismo comporta.

Refugiar-se na “complexidade” para evitar a obrigação intelectual e moral de exprimir um julgamento sobre o sionismo, significa assumir uma atitude similar à do revisionismo histórico, o qual também não se cansa de sublinhar a “complexidade”, no caso do fascismo, por exemplo. E não sem alguma razão, dado que, em seu tempo, foi o próprio Palmiro Togliatti que alertou contra as simplificações apressadas, chamando a atenção para o fato de que o fascismo é sim um movimento reacionário, mas um movimento reacionário que, pelo menos por um certo período de tempo, graças também à sua demagogia social, chegou a gozar de uma base de massa e até mesmo a atrair intelectuais que sucessivamente iriam amadurecer uma nítida opção pela esquerda. É uma lição de método que vai muito além da análise do fascismo. Remeter à complexidade é legítimo e fecundo quando estimula uma articulação mais rica e concreta do julgamento histórico, chamado a dar conta dos elementos de diferenciação e contradição que sempre irrompem no curso do processo de desenvolvimento de um fenômeno histórico complexo. Outras vezes, ao contrário, remeter à complexidade é uma fuga ao julgamento histórico, é um abandonar-se à mística da inefabilidade: é expressão de vontade mistificadora, ou seja, de assombro.

A causa anti-sionista dos palestinos e a causa dos judeus progressistas


Negar que o sionismo e a fundação do Estado de Israel sejam em primeiro lugar a resposta ao anti-semitismo e afirmar que desde o início os palestinos sofreram
uma injustiça, significa que se deva lutar pela destruição do Estado de Israel? Como fundamento dos EUA há um crime originário realizado contra os pele-vermelhas e os negros. E, todavia, ninguém pensa em fazer retornar os brancos à Europa, os negros à África e em despertar os que são de pele-vermelha do sono eterno. Desde os seus inícios, Israel tratou os palestinos em parte como se fossem pele-vermelhas (privando-os de suas terras e às vezes submetendo-os a dizimações), em parte como negros, discriminados, torturados, humilhados, na melhor das hipóteses constrangendo-os a ocupar os segmentos inferiores do mercado de trabalho.

O reconhecimento desse crime originário é o primeiro pressuposto para que possa haver justiça e reconciliação. Mas uma crítica tão radical a Israel e ao próprio sionismo não corre o risco de realimentar o anti-semitismo? Hannah Arendt fez troça do mito de um antisemitismo eterno. É um mito que afunda suas raízes no sionismo. Pelo menos os seus expoentes mais radicais, a partir de sua visão naturalista da nação, tendem a instituir uma contraposição natural e eterna “entre os judeus e os gentis”. Ou seja, o mito do anti-semitismo eterno afunda suas raízes em uma visão ela mesma densa de humores racistas. Em todo caso, é evidente o componente chauvinista dessa visão.

Não afirma Herzl que “uma nação é um grupo de pessoas mantidas juntas por um
inimigo comum”? É a partir de tal “teoria absurda” – observa a corajosa pensadora de origem judaica – que os sionistas cultivam o mito do anti-semitismo eterno22. São observações que remontam a 1945, mas que hoje são mais atuais do que nunca. Ainda depois de sua virada em sentido anticomunista e antimarxista, em 1963, Arendt declara que o “anti-semitismo, graças a Hitler, ficou desacreditado, talvez não para sempre, mas certamente pelo menos para a época atual”23. Por sua vez um conhecido cientista político norte-americano escreveu que, em nossos dias, “na Europa ocidental o anti-semitismo para com os judeus foi em larga medida suplantado pelo antisemitismo para com os árabes”24. Na realidade, isso não vale somente para as metrópoles urbanas na Europa Ocidental, mas também e sobretudo para o Oriente Médio.

A autenticidade do envolvimento contra o racismo mede-se não a partir da homenagem, ainda que devida, para com as vitimas do passado, mas, a partir em primeiro lugar, do apoio às vitimas atuais. Se não sabe tornar própria até o fundo a causa do povo palestino, a luta contra o racismo é somente uma frase vazia. É para ficar então atônito quando se lê em um “diário comunista” o convite para deixar “o anti-semitismo – antisionismo de princípio – aos racistas”25. A autora dessa afirmação, ou melhor dessa assimilação, ao mesmo tempo em que se recusa a levar em consideração a acusação de colonialismo e de racismo dirigida ao sionismo, de fato não hesita em taxar de racistas, entre outros, Victor Klemperer e Hannah Arendt. Quando esta última, em 1963, publica Eichmann em Jerusalém, com as suas flechas contra o sionismo e contra a tentativa de Israel de instrumentalizar o processo em sentido antiárabe, torna-se alvo de acusação como anti-semita. Na França, o semanário Nouvel Observateur, ao publicar trechos do livro (escolhidos com perfídia), pergunta-se sobre a autora: Est-elle nazie? É nazista? 26

Essa campanha não cessou, ainda que agora tenha em mira alvos considerados mais cômodos. Das colunas do International Herald Times expoentes progressistas da comunidade judeus norte-americana lançaram um grito de alarme: objetos de “desumanização” não são somente os palestinos, mas também os judeus que exprimem um julgamento crítico complexo sobre Israel, chegando às vezes a colocar em discussão o sionismo enquanto tal. É uma atitude que lhes pode custar caro, porque, além dos insultos, eles recebem repetidas ameaças de morte 27.


Aceitando acriticamente a equiparação de anti-sionismo e anti-semitismo propalada pelos dirigentes de Israel, uma certa esquerda trai não só a luta dos palestinos, mas também a dos judeus progressistas em Israel e no mundo, sob certos aspectos, não menos difícil e não menos corajosa.


Notas:

1 Vladimir Lênin, Opere Complete, vol. XXXIX, Editori Riuniti, Roma, 1955, p. 654.

2 Edward Said, La questione palestinese. La tragedia di essere vittima delle vittime, trad. Italiana Gamberetti, Roma, 1995, pp. 103-6

3 Hannah Arendt, Ebraismo e modernitá, org. G. Bettini, Unicopoli, Milão, 1986, p. 83.

4 Hannah Arendt, Essays & Kommentare, orgs. E. Geisel e K. Bittermann, Tiamat, Berlim, vol. II: Die Krise des Zionismus, 1989,.pp. 114-5.

5 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, pp. 85-8 e 92.

6 Victor Klemperer. Ich will Zeugnis ablegen bis zum letzten, vol. II: Tagebücher 1942-1945, org. W. Nowojski, Aufbau, Berlim, Quinta edição, 1996, p. 146.

7 Theodor Herzl, “Der Judenstaat” (1896), in Theodor Herzl’s Zionitische Schrifen, org. L. Kellner, Jüdischer Verlag, Berlin-Charlottenburg, vol. I, 1920, pp. 117-8.

8 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, pp. 101-2.

9 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, p. 30, nota 11 e p. 98.


10 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, pp. 107-8 e 131

11 Hannah Arendt, Eichamann in Jerusalem. A Report on the Banality of Evil (1963), tradução italiana La Banalità del male. Eichmann a Gerusalemme (1964). Feltrinelli, Milano. V edição. 1993, pp. 15-6 e 48.

12 George L. Mosse, The Crisis of German Ideology (1964), trad. Italiana Le origini culturali del Terzo Reich, Il Saggiatore, Milão, 1968, p. 270.

13 Robert A. Levine, 2001. “The Jews of the Wide World Didn’t Elect Sharon”, in International Herald Tribune, 5 de junho de 2001, p. 8.

14 Michael Lerner, “A Jew Gets Death Threats for Questioning Israel”, in International Herald Tribune, 23 de maio de 2001, p. 9.

15 Lee Hockstader, “Palestinian Authority described as ‘Terrorist’”, in International Herald Tribune, 1 de março de 2001, p. 4.

16 Hannah Arendt, Essays & Kommentare… 1989, p. 113.

17 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, p. 133.

18 Theodor Herzl, op. cit, pp. 52 e 49.

19 Max Nordau, Der Zionismus. Neue, vom Verfasser vollständig umgearbeitete und bis zur Gegenwart fortgeführte Auflage, org. Wiener Zionistischen Vereinigung, Buchdruckerei Hélios, Viena, 1913, p. 5.

20 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, p. 125.

21 William Safire, “Sharon in Moscow, Sword in Hand”, International Herald Tribune, 8-9 de setembro de 2001, p. 4.

22 Hannah Arendt, Ebraismo… 1986, pp. 90 e 97-8.

23 Hannah Arendt, Eichmann…, 1993, pp. 18-19.

24 Samuel P. Huntington, The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order, 1997, p. 293.

25 Rina Gagliardi, “Discutendo di sionismo e sinistra”, in Liberazione, 29 de agosto de 2001, p. 8.
26 Amos Elon, “The Case of Hannah Arendt”, in The New York Review of Books, 6 de novembro de 1997, pp. 25 e 29.

27 Lerner, op. cit.

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Domenico Losurdo nasceu em 1941, na Itália. Professor de História da Filosofia na Universidade de Urbino, doutorou-se com uma tese sobre Karl Rosenkranz. Escreveu, entre outros livros, A linguagem do império: léxicoda ideologia estadunidense (Boitempo, 2010), Democracia ou bonapartismo (Unesp, 2004), Nietzsche, o rebelde aristocrata (Revan, 2009) e Luta de classes: umahistória política e filosófica (Boitempo, 2015).

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