domingo, 8 de novembro de 2015

Caetano Veloso, sobre Israel: “acho que nunca mais voltarei lá”

Gilberto Gil e Caetano Veloso em Susya na Palestina
Gil e Caetano visitam Susya na Palestina para conhecer a realidade da ocupação israelense


Em artigo, músico fala sobre suas impressões da visita que fez ao país e a áreas da Cisjordânia. “Eu quero a paz que se mostra desde sempre impossível. Mas agora eu a quero sentindo-me muito mais próximo dos palestinos do que jamais me imaginei –e muito mais longe de Israel do que suporia meu coração há apenas pouco mais de um ano”


Por Redação da Revista Fórum


O músico Caetano Veloso conta, em artigo publicado no caderno Ilustríssima, da Folha de S. Paulo, suas impressões a respeito de sua visita a áreas da Cisjordânia, em julho deste ano. Na ocasião, ele esteve em Israel para fazer um show com Gilberto Gil, tendo recebido diversos apelos, como do músico Roger Waters e do Nobel da Paz Desmond Tutu, para não ir ao país em função da política de opressão do Estado israelense contra os palestinos.

Caetano diz que Tel Aviv, a capital do país, tem para ele o “aspecto de uma das nossas capitais nordestinas, e o seu povo, o ar altivamente desencanado do carioca”. Mesmo tendo ido lá em outras ocasiões, desta vez estranhou o fato de não haver presença ostensiva de soldados nas ruas. “Era difícil reconhecer que essa paz refletia o maior poder adquirido pelo Estado de Israel, sua certeza de que a cúpula de proteção construída por sua defesa está firme. Será, como diz Marcelo Yuka, a paz que não quero?”, questiona, referindo-se à canção do grupo O Rappa.

O músico narra o encontro com membros do Breaking The Silence, grupo de israelenses crítico à política oficial do governo em relação aos palestinos. “Alguns apoiadores do BDS, movimento internacional de boicote a Israel, tinham nos procurado, a Gil e a mim, na tentativa de dissuadir-nos de ir a Tel Aviv. Pelo que ouvi da boca de Yehuda –e de Nasser, o palestino de Susiya que por ele nos foi apresentado– todas as queixas dos participantes do BDS são fundadas”, conta.

Ao visitar um acampamento palestino na Cisjordânia, Caetano também relata ter se lembrado do Brasil. “As favelas brasileiras ocupadas me vinham à mente. Eu não queria fazer um reducionismo político e usar um esquema único para avaliar questões brasileiras à luz da situação palestina, mas as imagens de fracassos pontuais das UPPs no Rio (não apenas o caso Amarildo) vinham à cabeça. Nós, os visitantes, não éramos estranhos às desumanidades que testemunhávamos no Oriente Médio. Era impossível não fazer paralelo com situações que vivemos no Brasil.”

“Eu quero a paz que se mostra desde sempre impossível. Mas agora eu a quero sentindo-me muito mais próximo dos palestinos do que jamais me imaginei –e muito mais longe de Israel do que suporia meu coração há apenas pouco mais de um ano”, refllete, em outro trecho do texto. Ao fim do artigo, o músico conclui: “Gosto de Israel fisicamente. Tel Aviv é um lugar meu, de que tenho saudade, quase como tenho da Bahia. Mas acho que nunca mais voltarei lá.”


Leia a íntegra do artigo aqui.

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sábado, 7 de novembro de 2015

Palestina: a colonização israelense é a raiz da violência

O que vemos - e seguiremos vendo - na Palestina é a luta existencial do povo nativo de um país que ainda está sob ameaça de destruição.


Do site da Carta Maior

Ilan Pappe*, para Al Jazeera


O olhar do menino palestino


Em meio do que se chegou a conhecer em Israel como a “Intifada dos esfaqueadores”, acontece uma cena pouco usual em Ramat Gan, onde muitos dos residentes são judeus iraquianos. Uma mulher estava protegendo um homem que estava caído no chão. Ele estava sendo perseguido por uma turba, incluindo alguns soldados, que queriam linchá-lo.

Enquanto estava caído, ele foi pulverizado com gás pimenta, atirado nos olhos, a queima-roupa, até que conseguiu murmurar ao seu anjo guardião: “sou judeu”. Quando a turba conseguiu compreender a mensagem o deixou sozinho.

Ele foi perseguido porque quase todos os judeus iraquianos se parecem com os palestinos – aliás, a maioria de nós, judeus de Israel, nos parecemos aos palestinos. Os únicos judeus que estão “protegidos” são os judeus ortodoxos mizrahim, que usam as mesmas vestimentas que os seus antepassados asquenazes usavam na Europa do Século XVII, deixando de lado sua tradicional vestimenta “árabe”.

Gente invisível


Esse ataque não foi o único. Outros judeus árabes foram confundidos com palestinos. Ser considerado árabe em Israel, inclusive pela aparência, significa que ser um dos invisíveis e prescindíveis nativos sem direitos.

Uma atitude semelhante não é única na história. Muitas sociedades de assentamentos coloniais adotaram essa atitude com relação aos nativos: os nativos, para essas sociedades, constituem um obstáculo que deve ser removido, junto com as rochas nos campos, os mosquitos nos pântanos e, no caso do sionismo, junto com os judeus menos adequados física e culturalmente.

Depois do Holocausto, o sionismo já não pode permitir ser tão exigente.

Quando se analisam as origens da atual intifada, pode-se apontar corretamente a ocupação e a expansão da colonização judia.

Mas o desespero que a atual agitação produziu não é um resultado direto da colonização de 1967, mas sim do processo que vem sendo invisibilizado a mais de 100 anos: a desumanização e destruição potencial do povo palestino onde quer que ele se encontre.

Essa negação da humanidade dos nativos da Palestina se encontra profundamente arraigado no atual cenário político israelense, pode ser visto nos discursos dos principais líderes, tanto o primeiro-ministro Benjamín Netanyahu quanto o líder da oposição, Yitzhak Herzog.

Netanyahu explicou, nesta terça-feira, em seu discurso no Knéset (parlamento israelense), que o desespero dos palestinos produzirá mais e mais intifadas no futuro, porque a deslegitimação internacional de Israel aumentará exponencialmente. Descreveu os 100 anos da colonização como um projeto digno, ao qual o povo nativo da Palestina se opôs sem razão alguma.

A mensagem aos palestinos foi clara: “aceitem a sua sina de reclusos invisíveis, sem cidadania, nas duas maiores prisões do mundo (Cisjordânia e Faixa de Gaza) e um severo regime de apartheid, e só então todos poderemos viver em paz. Qualquer tentativa de rechaçar essa realidade será considerada terrorismo da pior classe, e será tratada com a dureza que corresponde.

Dentro desta narrativa, se o autor do discurso tentava acalmar as preocupações do mundo muçulmano sobre o que acontece com o al-Haram al Sharif (o Nobre Santuário), o que conseguiu foi exatamente o contrário. Grande parte do seu discurso foi uma lição de história sobre porque o lugar pertence ao povo judeu – e embora tenha terminado essa parte do discurso com a promessa de não mudar o seu status quo, não se pode dizer que a presença dos dirigentes de um partido que acredita na necessidade de construir um terceiro templo no lugar seja particularmente tranquilizante.

“Nunca juntos”


Por sua parte, Herzog, o líder da oposição liberal sionista, manifestou a desumanização dos palestinos de uma maneira diferente. Seu pesadelo, disse ele, repetidas vezes, é um país no qual judeus e palestinos tenham que viver juntos.

Por isso a separação, a criação de guetos e enclaves, é a melhor solução, inclusive se significa reduzir um pouco o grande Israel. “Estamos nós aqui e eles lá”, diz o famoso slogan de Ehud Barak e Shimon Peres, no final dos Anos 90.

O jornalista liberal sionista de Haaretz, Barak Ravid, repetiu o horror dos sionistas liberais: “se existir um Estado binacional, os esfaqueamentos serão diários”, advertiu. A ideia de que um território compartilhado entre Israel e Palestina seja uma democracia para todos nunca foi parte do programa liberal sionista.

Esse desejo de não compartilhar a vida com qualquer coisa que cheire a árabe é uma atitude que afeta diariamente cada palestino. Mais de um século de colonização e nada mudou na negação total da humanidade dos palestinos nativos ou sobre o seu direito ao território onde vivem.

A atual onda de protestos e ataques individuais foi provocada pela política e pelas ações israelenses contra a mesquita Al-Aqsa. Mas a origem é uma atrocidade contínua, que já dura um século: o crescente “culturicídio” da Palestina.

O mundo ocidental se horroriza com a destruição das antigas joias culturais cometidas pelo Estado Islâmico (EI-ISIL-Daesh). A destruição e eliminação, por parte de Israel, do patrimônio islâmico da Palestina, é muito mais ampla e significativa. Apenas uma mesquita se manteve intacta depois do Nakba e muitas das restantes foram transformadas em restaurantes, discotecas e granjas.

Qualquer tentativa dos palestinos de ressuscitar seu patrimônio teatral e literário é considerado por Israel como uma comemoração do Nakba, e portanto ilegal se é realizado por quem depende dos subsídios governamentais.

O que vemos – e seguiremos vendo – na Palestina, é a luta existencial do povo nativo de um país que ainda está sob ameaça de destruição.

* Ilan Pappe é diretor do Centro Europeu de Estudos Palestinos da Universidade de Exeter. Já publicou quinze livros sobre o Oriente Médio e a questão palestina.

Tradução Victor Farinelli

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