quarta-feira, 8 de junho de 2011

Como o lobby israelense congela o debate sobre o Oriente Médio


4/6/2011, MJ Rosenberg, Al-Jazeera, Qatar

Essa semana, depois da escandalosa recepção ao primeiro-ministro Netanyahu no Congresso dos EUA, quero partilhar uma lembrança pessoal de como o status quo no Oriente Médio é preservado no Capitólio.

Era 1988, e eu trabalhava como assessor para política exterior do senador Carl Levin (Democrata, Michigan). Um dia, em fevereiro, Levin chamou-me a sua sala. Estava muito preocupado com uma declaração que lera no New York Times aquele dia. Um artigo citava o primeiro-ministro de Israel, Yitzhak Shamir, que dissera que rejeitava a ideia de retirar-se de qualquer parte da terra que Israel ocupara na guerra de 1967: “O ministro Shamir disse em entrevista a uma rádio, que ‘é claro que, para mim, nenhuma troca de território por paz será jamais aceitável’” (matéria de arquivo, só acessível para assinantes do jornal).

Levin entendeu perfeitamente o que Shamir estava fazendo: estava repudiando duas Resoluções do Conselho de Segurança da ONU, n. 242 e 338 (de cuja redação Israel participou) e que ordenavam “a retirada das forças armadas de Israel dos territórios ocupados no recente [1967] conflito” em troca de paz e segurança. Aquelas resoluções manifestavam então, como manifestam até hoje, a política oficial dos EUA e da ONU. Mas, em 1988, Shamir as declarara nulas e sem efeito.

Levin pediu-me que redigisse uma carta dirigida ao secretário de Estado George Shultz, declarando que o Senado dos EUA entendia que as resoluções da ONU permaneciam plenamente válidas e manifestavam a política dos EUA, Shamir gostasse ou não. A carta foi escrita, não exatamente nesses termos, é claro: uma carta muito polida. E Levin queria que a carta fosse endereçada a Shultz, não ao próprio Shamir, para evitar arrepiar demais os falcões de Israel.

Escrevi um primeiro rascunho. Levin editou e reeditou. Em seguida, convocou o presidente do AIPAC, Thomas A. Dine, para que examinasse os termos da carta. Tom aprovou: na avaliação dele, a carta estava “ótima”. Levin disse a Dine que manteria em sigilo o fato de que a carta fora aprovada por ele, para evitar-lhe qualquer embaraço.

Levin então pediu-me que entregasse a carta ao secretário de Estado, mas pediu algum tempo porque, antes, queria tentar reunir algumas outras assinaturas de senadores. Em uma hora, a carta estava assinada por 30 senadores. Não fosse sexta-feira, Levin teria facilmente reunido mais uma centena de assinaturas, mas era tarde, e a Casa já estava praticamente vazia.

Entreguei a carta. Levin não queria excessivo alarde sobre a carta e, por isso, o gabinete do senador não informou a imprensa. Na prática, era iniciativa secreta.

Mas um dos senadores passara cópia da carta ao New York Times. E em minutos os telefones começaram a tocar. Repórteres e financiadores do AIPAC (que não sabiam que Dine conhecia e aprovara o texto) estavam furiosos.

Levin foi procurado para entrevistas pelos três principais programas de notícias das manhãs de domingo. Não aceitou. De fato, como previsto há muito tempo, embarcou no sábado para Moscou.
No domingo, a primeira página do New York Times estampava manchete e longa matéria sobre a “Carta dos 30”, de Levin:

"Trinta senadores dos EUA, inclusive muitos dos principais apoiadores de Israel, enviaram carta em que criticam o primeiro-ministro Yitzhak Shamir e seu Partido Likud, sugerindo que estariam obstruindo esforços para um acordo de paz no Oriente Médio.
 
A extraordinária crítica pública a Israel veio em carta dirigida ao secretário de Estado George P Shultz, que retornou hoje de viagem de vários dias ao Oriente Médio. O secretário Shultz propôs, nessa viagem, as linhas gerais de um acordo provisório entre Israel e os palestinos (...).
 
Os senadores que assinaram a carta declaram-se preocupados ante a continuada resistência, por Israel, à ideia de ceder terras ocupadas em troca de paz, pedra angular dos esforços do secretário Shultz. Embora a carta também critique outros estados árabes, exceto o Egito, auxiliares do senador informaram que a intenção foi, principalmente, mandar recado claro ao primeiro-ministro Shamir e ao bloco do Likud."


Era tão significativo o fato de que, antes, nenhum senador dos EUA jamais criticara qualquer política de Israel (nem indiretamente), que, no domingo, o Sunday Times insistiu no assunto e publicou a carta na íntegra.
Na segunda-feira, o mundo veio abaixo. Como Levin estava na Rússia, seus assessores tiveram de responder aos telefonemas dos jornais e às ameaças de doadores de campanha, eleitores e organizações ‘pró-Israel’, todos furiosos. E, às tantas, aconteceu algo absolutamente inimaginável.

Um alto funcionário da embaixada de Israel veio ao gabinete, para apresentar pessoalmente mensagem de protesto do primeiro-ministro Shamir. O chefe de gabinete do senador Levin, Gordon C Kerr, disse-lhe que não fazia sentido algum um funcionário de embaixada apresentar qualquer protesto contra carta de senadores norte-americanos dirigida ao próprio governo dos EUA. Disse-o, é claro, em termos absolutamente polidos. 

O funcionário da embaixada de Israel insultou Levin e fez-lhe graves ameaças. Kerr expulsou-o do gabinete.
Simultaneamente, Levin recebeu mensagem do presidente Ronald Reagan em que o presidente agradecia a contribuição de organizar apoio à posição do seu governo; e Shamir pôs-se a telefonar para os senadores, dizendo-se “atônito” por suas políticas estarem sendo alvo de críticas.

Aconteceu então o momento que, para mim, foi a experiência mais chocante de todos os anos em que trabalhei para o governo dos EUA. William Safire, o colunista mais influente do New York Times, telefonou-me, em fúria. Disse que sabia, de fonte segura, que nem Levin nem eu escrevêramos aquela carta. Disse que sabia que a carta fora escrita por um assessor do líder do Partido Labour de Israel, Shimon Peres.

Disse que aquele assessor, alguém chamado Yossi Beilin, entregara-me um rascunho manuscrito da carta e que eu convencera Levin a assinar e reunir apoios. Disse-me que eu trabalhava para derrubar o governo de Shamir e substituí-lo por governo de Peres. Por pouco não deixei escapar uma gargalhada.

A simples ideia de que um assessor de senador tivesse tanto poder já era, só ela, um absurdo. Mas Safire fez ameaças. Perguntou se eu achava correto que um assessor de um senador dos EUA estivesse a serviço de partido político estrangeiro, e se eu sabia o que aconteceria quando Levin descobrisse sobre mim, na coluna de Safire no New York Times. Assustador. Como assessor de senador, eu jurara fidelidade aos EUA e à Constituição. Tinha passe livre, dado pela segurança. As consequências seriam arrasadoras.

Eu disse a Safire que eu rascunhara a carta e que Levin reescrevera, ele mesmo, longos trechos. Disse que jamais ouvira falar de Beilin (pura verdade). Safire, então, enlouqueceu. Disse que sabia que eu estava mentindo, porque recebera a história ‘real’ de fontes seguras: de Binyamin Netanyahu, então embaixador de Israel na ONU, e de Steve Rosen, número dois do comando do AIPAC (que, mais tarde, foi acusado de espionagem).

Respondi que não me interessava quem lhe tivesse contado. Que era mentira. E que Levin tomara a iniciativa de escrever ao secretário de Estado para ajudar Israel, porque entendia que, se Israel se opusesse à retirada dos territórios palestinos ocupados, o conflito jamais teria fim.

A conclusão da conversa foi que Safire recuou, não antes de me ameaçar mais uma vez: se ele descobrisse que eu mentira, eu estaria “acabado”. Disse que não escreveria a coluna,  porque – acredite quem quiser – acreditava mais em mim que em suas fontes.

E foi isso. Ninguém mais falou sobre a “Carta dos 30”, exceto para lembrar que, depois dos ataques viciosos contra Levin, poucos senadores dos EUA voltaram a desafiar o governo de Israel e o AIPAC.
E qual é a moral da história?

É a seguinte: criticar Israel é muito perigoso. Não fosse o medo, o que levaria um poderoso colunista do New York Times a telefonar a um assessor de senador e ameaçá-lo nos termos em que Safire ameaçou-me, de destruir minha carreira? Só o medo. E o que faria um colunista do New York Times agir como empregado do governo de Israel? Naquele dia, Safire não foi nem jornalista: trabalhava como agente do governo de Israel.

Quem, sabendo disso, surpreender-se-ia com o circo em que se converteu o senado dos EUA, aos pulos nas cadeiras, levanta e senta, levanta e senta, gritando de amores por Netanyahu? Quem se atreveria a vaiar um gorila de uma tonelada? Com certeza, não os eleitos para o Congresso dos EUA.

A parte boa de toda essa história, é que Levin apoiou-me 100%. A carta criou-lhe muitos problemas com doadores de campanha, mas ele sempre a defendeu – e de lá até hoje já foi reeleito quatro vezes. De fato, disse-me, há muito tempo, que se orgulha muito de ter redigido aquela carta. Ele redigiu. Não eu. 



Fonte: Redecastorphoto. Tradução: Vila Vudu


segunda-feira, 30 de maio de 2011

MST vai colher azeitonas na Palestina


ANBA – Agência de Notícias Brasil-Árabe

30/05/2011

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra vai enviar 40 voluntários para ajudar os palestinos na colheita da azeitona em outubro. O movimento tem relações com o país árabe há quase dez anos.


São Paulo – Um grupo com 30 a 40 pessoas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) vai participar da colheita da azeitona palestina em outubro deste ano. A informação é de Marcelo Buzetto, do setor de relações internacionais da organização, que esteve no país árabe participando de uma conferência de movimentos de esquerda no começo de maio. De acordo com Buzetto, o MST vai dar apoio aos produtores no período.
Buzetto já esteve algumas vezes na Palestina

Ele explica que os representantes do MST participarão efetivamente da colheita, trabalhando na terra, e ficarão hospedados em casas de camponeses palestinos. No ano passado, de acordo com Buzetto, duas pessoas do movimento já participaram.

Além disso, a organização trabalha para ajudar a viabilizar o comércio de produtos do país árabe, inclusive de azeitonas. Ele lembra que o Brasil, por exemplo, importa azeite de oliva de regiões como a Europa e poderia, em vez disso, comprar da Palestina. Integrantes do movimento conversaram com diplomatas do Brasil e Venezuela na região sobre o tema.

O MST tem, de acordo com relatos de Buzetto, uma relação de quase dez anos com os palestinos. Tudo começou em 2002, quando um integrante do movimento, Mário Lill, esteve por 22 dias com Yasser Arafat, quando ele se encontrava cercado pelo exército israelense, em Ramallah, na Cisjordânia. Na ocasião, ele entregou ao líder palestino, morto em 2004, uma bandeira do movimento, em sinal de solidariedade ao país.

Depois disso, representantes da organização estiveram outras vezes na Palestina, em oportunidades como o Fórum Social Palestino, em 2003, e no ano passado, quanto pela primeira vez houve ajuda na colheita de azeitonas.

O MST, junto com a Via Campesina, movimento mundial de trabalhadores rurais da qual o grupo brasileiro é um dos fundadores, quer fundar a Via Campesina no país árabe. Na verdade, a Palestina já tem uma série de movimentos organizados, como a União dos Comitês de Trabalhadores Agrícolas, União dos Comitês de Mulheres Palestinas e Centro de Informação Alternativa, e a idéia é reunir todos eles, dando-lhes um espaço comum, para que trabalhem no apoio aos camponeses, trabalhadores rurais e pescadores, que é a proposta da organização.

Buzetto explica que o objetivo da Via Campesina é lutar para que terra, água, sementes e recursos naturais não sejam controlados por poucos. “E lá são controlados por empresas israelenses”, explica. Alguns dos grupos sociais palestinos, como a União dos Comitês de Trabalhadores Agrícolas, já participam das ações da Via Campesina. A organização, aliás, deve promover em novembro, logo após a colheita de azeitona, uma conferência internacional, para a qual serão convidados integrantes do grupo da África, Ásia, Europa e Américas.

Na viagem de Buzetto à Palestina no começo deste mês, o MST foi homenageado. A conferência da qual o brasileiro participou, das esquerdas, em Hebron, teve como título “Uma luta conjunta para o fim da ocupação e do racismo” e teve o financiamento da Agência Catalã de Cooperação ao Desenvolvimento (ACCD), por meio da organização não-governamental Sodepau. “Nós fizemos uma homenagem a eles (entregando a bandeira do Brasil e do MST) e também fomos homenageados por ser uma organização que está mais presente a cada ano”, conta Buzetto. No final de novembro, o MST promove, no Brasil, um encontro nacional de solidariedade ao povo palestino.




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