No vácuo aberto por crise da Odebrecht, Elbit domina
fornecimento de drones e sistemas de comunicação das Forças Armadas
Breno Costa - The Intercept - set/2016
Odebrecht é acusada de seguidas violações de Direitos
Humanos na Palestina. / Reprodução
|
A crise financeira gerada pelas descobertas da Operação Lava
Jato sobre os negócios do grupo Odebrecht acaba de provocar um efeito
secundário preocupante: o crescimento expressivo, dentro do Brasil, da principal
fabricante mundial de drones de uso bélico e alvo de fortes críticas de
organizações de direitos humanos.
No último dia 5, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica) aprovou a venda dos negócios de comunicação militar da Mectron
Engenharia, empresa da área de defesa do grupo Odebrecht, para a Elbit Systems.
Essa companhia é responsável pela fabricação de quase todas as aeronaves não
tripuladas usadas por Israel em bombardeios na Faixa de Gaza, além de ter papel
preponderante na vigilância que envolve o muro erguido pelos israelenses para
separar o país do território palestino. Na última ofensiva de Israel, em 2014,
a organização Defense for Children International relatou que 164 crianças foram mortas em ataques executados por drones fabricados pela Elbit.
A Elbit é a maior companhia privada da área militar dentro
de Israel. Somente com a produção de drones e a venda deles para o Exército de
Israel e forças armadas de outros países em todo o mundo, a empresa faturou US$
1,2 bilhão em 2015, conforme seu último balanço.
Devido a esse envolvimento direto da Elbit Systems nas ações
militares de Israel, a corporação é alvo de boicotes internacionais entre
defensores dos direitos humanos e da causa palestina, mas também por parte de
governos estrangeiros, que acabaram vetando negócios com a empresa. Entre eles,
estão Suécia, Noruega, Dinamarca (cujos fundos de pensão retiraram
investimentos feitos na empresa) e, mais recentemente, a França, que, em
fevereiro deste ano, anunciou que não compraria mais drones produzidos pela
Elbit.
No Brasil, entretanto, a companhia israelense opera
normalmente. E com força. Desde 2008, quando a Elbit em Israel passou a ser
vinculada com violações de direitos humanos depois que o Conselho de Direitos
Humanos da ONU considerou que os ataques apoiados por drones na ofensiva de
2008-2009 contra a Palestina representaram graves violações de direitos humanos
e possíveis “crimes de guerra e crimes contra a humanidade“, a principal
subsidiária da empresa dentro do Brasil já recebeu mais de R$ 456 milhões das
Forças Armadas Brasileiras, especialmente da Aeronáutica, de acordo com dados
do Portal da Transparência do governo federal.
A empresa já tinha três subsidiárias dentro do Brasil. A
principal delas, que atua na área de drones, é a AEL Sistemas Ltda, com sede em
Porto Alegre.
O único sobressalto que os israelenses tiveram em suas
operações no Brasil aconteceu no final de 2014, quando o então governador do
Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT) cancelou um acordo assinado no ano anterior
com a AEL, que permitia financiamentos públicos à empresa, além de acesso a
tecnologias produzidas por universidades gaúchas. O objetivo da parceria era a
construção de um parque aeroespacial militar no Estado.
É essa empresa que irá herdar os negócios da Mectron na
sensível área de comunicação militar – incluindo o desenvolvimento de
computadores de missão para drones.
No pacote negociado, também estão sistemas de Rádio Definido
por Software (RDS) e outros sistemas de comunicação, além, claro, de todos os
contratos vigentes da Mectron com as Forças Armadas brasileiras. Nesse grupo
está incluído, entre outros, um contrato de R$ 193 milhões com a Força Aérea
Brasileira, assinado em 2012 e ainda vigente, para a produção de um moderno e
inovador sistema de comunicação entre caças e torres de comando (projeto LinkBR-2).
Os israelenses da Elbit agora terão controle sobre isso –
desde que as nossas Forças Armadas autorizem que os contratos da Mectron sejam
repassados para a Elbit. Consultada a respeito pelo The Intercept Brasil, a FAB
respondeu apenas que “O assunto está sendo analisado pela Força Aérea
Brasileira”.
Para Michel Temer, drones usados no Brasil têm “resultado
extraordinário”
A chegada dos drones israelenses ao Brasil começou em 2010.
Em dezembro daquele ano, a Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de
Combate, vinculada ao Comando da Aeronáutica, acertou com a Aeroeletrônica
(antigo nome da AEL, mas já controlada pela Elbit), o fornecimento de dois
drones Hermes 450, fabricados pela empresa israelense.
Drone Hermes 450 em operação | Foto: Sgt. Johnson/Força
Aérea Brasileira
|
Esses drones foram contratados sem licitação. O argumento do
governo era a notória especialização da fabricante. De fato, o drone já tinha
sido testado em combate havia pouco tempo. Na ofensiva de 2008-2009 ao
território palestino, Israel usou e abusou desses mesmos drones para lançar
bombas contra, supostamente, alvos militares.Centenas de civis morreram.
Naquele mesmo ano, no Brasil, a Polícia Federal também contratou drones, mas da EAE Soluções Aeroespaciais Ltda, uma joint
ventureformada entre o grupo brasileiro Synergy, dos donos da Avianca, e a
empresa estatal israelense IAI (Israel Aerospace Industries).
Em 2012, o então vice-presidente Michel Temer elogiou
entusiasmadamente a eficiência dos drones israelenses da Elbit. Ao lado de um
deles, em entrevista dada na ocasião, o então vice-presidente destacou que o
avião não tripulado produz “um resultado extraordinário” e “uma eficiência
extraordinária” no controle das fronteiras.
Os contratos de 2010 abriram as portas do Brasil para o
mercado de drones. No ano seguinte, a Elbit anunciou uma união com a Embraer para criar uma empresa destinada a produzir aeronaves não tripuladas com
design brasileiro, a Harpia Sistemas. Diante da crise econômica no país, a
empresa acabou sendo fechada em janeiro deste ano. No entanto, em comunicado
aos investidores, a Elbit deixou claro que as empresas “concordaram em
trabalhar juntas no futuro”.
Os grandes eventos do país, mais especificamente a Copa do
Mundo de 2014, serviram de impulso para as operações da Elbit no Brasil. Apenas
em 2013, quando foi realizada a Copa das Confederações, a empresa recebeu R$
102,6 milhões do governo, e os drones foram usados para monitorar inclusive as
manifestações de rua daquele ano. Foi o maior valor registrado até aqui.
Em março de 2014, a Elbit anunciou o fornecimento de uma
linha de Hermes 900 para a FAB. O Brasil foi o oitavo país do mundo a adquiriressa aeronave, o drone mais moderno e mais potente fabricado pela empresa
israelense. O modelo tem autonomia de
voo de 36 horas e alcança raio de 300 km em relação à sua base em solo. É o
dobro da capacidade do Hermes 450.
Fonte: Brasil de Fato
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Fonte: Brasil de Fato
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