domingo, 19 de junho de 2016

Serra e Israel

Esplanada das Mesquitas - Jerusalém
O Monte do Templo é um lugar sagrado para judeus, cristãos e muçulmanos, sendo também um dos locais mais disputados do mundo. Foto: EBC

Por Salem Nasser


Não deixa de ser interessante observar como um governo interino, precário, age como se destinado à permanência, ao longo prazo

Não só deixa a impressão de que nada está acontecendo no Senado e de que já não há uma presidente suspensa que poderia voltar, mas faz também pensar que teria sido de fato eleito e, portanto, estaria legitimado para redirecionar os destinos do País.

Escolhas fundamentais que determinarão em alguma medida nosso futuro são feitas pelo governo de um presidente que jamais estaria sentado na cadeira se não tivesse sido o vice-presidente sob a bandeira de escolhas diferentes.

É também assim na política externa, agora comandada pelo portador de um projeto derrotado nas urnas todas as vezes desde 2002.

Mas não é apenas nosso comportamento futuro que Serra quer mudar. Na semana que passou, uma nota do Ministério das Relações Exteriores expressou o desejo de mudar o que já está consumado.

nota fazia referência a uma decisão do Conselho Executivo da UNESCO sobre o Patrimônio Cultural nos Territórios Palestinos Ocupados, aprovada por 33 votos, inclusive o brasileiro, a 6 e 17 abstenções, em abril último.

Nosso ministério faz agora críticas ao que seria o caráter parcial da decisão, por não levar em conta os laços históricos do povo judeu com a cidade velha de Jerusalém, indica que votará diferentemente no futuro caso o mesmo vício se verifique e, portanto, indica que se tivesse que votar hoje se juntaria aos seis derrotados.

Não deve haver surpresa em relação a esse desejo de que o passado fosse outro, quando o desejoso não se furtava, enquanto o passado se fazia, de fazer as suas críticas.

Mas a nota não é apenas a expressão desse desejo. Ela é um aceno, uma concessão, uma espécie de pedido de desculpas, uma promessa de romance e enlaces futuros.

Não se sabe se a demanda por todas essas coisas chegou cochichada ao ouvido de José Serra ou se ele as ofereceu movido pela espontaneidade de alguma paixão.

E para fazer os gestos, levou-se o Itamaraty a responder ao que não estava na decisão da UNESCO e a pedir que ela dissesse o que não fazia parte de seu objeto.

Essencialmente, a decisão afirma a responsabilidade que tem Israel, enquanto potência ocupante, de preservar o sítios históricos de toda a velha cidade de Jerusalém e especificamente aqueles relacionados aos lugares santos do Islã, e lamenta a violação por Israel de suas obrigações em relação a essa preservação.

Afirmar os laços históricos do povo judeu em relação ao muro ocidental, como pede a nota brasileira, serviria a quê? Seria um lembrete a Israel de que deve também preservar o muro ocidental ou seria oferecer a Israel uma desculpa para seguir colocando em risco os monumentos outros e restringindo o acesso dos palestinos a eles?

Um ministro que nos prometia uma política externa “de Estado”, por oposição àquela “de governo e de partido” antes praticada, parece querer mudar radicalmente o posicionamento brasileiro em uma questão central da política internacional.

Ironicamente, esse era um daqueles temas em que o grupo político do próprio ministro insistiu por muito tempo que o Brasil não deveria se meter, porque não era para o nosso bico.

Afastamo-nos agora do consenso internacional, namoramos o opressor e seus padrinhos em detrimento do oprimido e da justiça e o fazemos por alguma razão, desconhecida, que não tem nada a ver com os interesses do Estado brasileiro.

Eis de volta o tempo das genuflexões.




SALEM NASSER ensaia aqui um certo olhar, diferente, sobre Oriente Médio, Islã, Mundo Árabe e mais algumas coisas.


Doutor em Direito Internacional pela Universidade de São Paulo (2004). Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1990), obteve um DSU - Diploma Superior da Universidade em Direito Internacional Privado e um DEA - Diploma de Estudos Aprofundados em Direito Internacional Público - da Universidade de Paris II - Panthéon Sorbonne (1992 e 19933). Desde 2004, é professor da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas.


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sábado, 7 de maio de 2016

Londres elegeu seu novo prefeito: ele é muçulmano, de esquerda e filho de um motorista de ônibus


"Refugiados são bem-vindos", diz cartaz. Foto: Swlondoner




O muçulmano Sadiq Khan é eleito o novo prefeito de Londres


No El País Brasil


O trabalhista Sadiq Khan será o novo prefeito de Londres. Com 99% dos votos apurados, o candidato trabalhista abria na tarde desta sexta-feira nove pontos de vantagem sobre seu rival conservador, Zac Goldsmith, tornando-se assim o primeiro prefeito muçulmano a governar uma capital ocidental.

A vitória em Londres, governada há oito anos pelo conservador Boris Johnson, era crucial para o Partido Trabalhista, que saiu desta superquinta com um balanço agridoce. O partido de oposição, em seu primeiro teste nas urnas desde que o socialista Jeremy Corbyn assumiu sua liderança, em setembro, continua dominante nos municípios ingleses – perde seis pontos percentuais de apoio desde o último pleito municipal, mas subiu quatro em relação à eleição geral de 2015. Na Escócia, por outro lado, os trabalhistas sofreram um revés e perderam o domínio para os consevadores – o que já era esperado, mas nem por isso é menos notável. Ganhar em Londres, portanto, contribuiria para acalmar os numerosos deputados que veem a guinada à esquerda sob Corbyn como um suicídio eleitoral.

A disputa pela prefeitura de Londres – terceiro maior mandato pessoal da Europa, atrás dos presidentes de França e Portugal – foi acirrada. Os ataques pessoais entre os dois principais candidatos (de um total de 12) ofuscaram o necessário debate sobre os colossais desafios que a capital enfrenta. Goldsmith acusou Khan de radical, por compartilhar palanque com extremistas islâmicos, e Khan reagiu tachando seu adversário de islamofóbico.

Nos últimos dias, a campanha ficou ainda mais turvada por causa de um escândalo de antissemitismo surgido no seio do Partido Trabalhista, que resultou na suspensão de uma deputada e do veterano Ken Livingston, prefeito de Londres entre 2000 e 2008, e numa investigação interna ordenada por Corbyn. Mas seus críticos o acusaram de reagir tarde demais, e o próprio Khan admitiu que o caso poderia ter prejudicado a sua campanha.

Os perfis dos dois candidatos não poderiam ser mais diferentes. Sadiq Khan, de 46 anos, é filho de um motorista de ônibus paquistanês. Zac Goldsmith, de 41, é o bilionário herdeiro de uma dinastia de banqueiros. Khan cresceu num imóvel subsidiado pelo Estado; Goldsmith, numa mansão. Khan estudou em colégio público; Goldsmith, no elitista Eton. Khan é muçulmano praticante, defende o casamento homossexual e trabalhou como advogado pró-direitos humanos antes de se eleger parlamentar pelo distrito de Tooting, na zona sul da cidade, em 2004. Goldsmith é um judeu não praticante, que dirigiu uma revista de assuntos ambientais e foi eleito em 2010 por Richmond, na zona oeste.


O referendo de 23 de junho sobre a permanência do país na União Europeia também pairou sobre a campanha eleitoral. Khan é um europeísta convicto, ao passo que Goldsmith – filho de um fervoroso eurocético que fundou nos anos noventa o Partido do Referendo – faz campanha pelo Brexit. Por isso, muita gente tentará ver nesta eleição uma antessala da consulta a ser realizada daqui a um mês e meio.

Fonte: O cafezinho 

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