quarta-feira, 25 de maio de 2011

Oriente Médio: Obama e Netanyahu não estão tão distantes

A frase “As fronteiras de Israel e da Palestina deveriam ser estabelecidas sobre as linhas de 1967 com intercâmbios aceitos por ambos Estados” foi uma das mais comentadas do último discurso do presidente norte-americano Barack Obama sobre Oriente Médio e Norte da África.

Por Pierre Klochendler, na agência IPS

O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu entrou imediatamente em cena, mesmo antes de sua chegada a Washington para sua bastante antecipada reunião com Obama, e descartou plenamente a proposta como algo “indefensável”.


Foram inúmeras as notícias na imprensa israelense sobre uma nova crise de confiança entre os dois líderes e sobre uma “furiosa” troca de telefonemas entre Netanyahu e a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, às vésperas da cúpula. A linguagem corporal de Netanyahu e Obama ao aparecerem publicamente na Casa Branca não mostrava indícios de cordialidade.

O ministro israelense da Defesa, Ehud Barak, tentou acalmar os temores quando afirmou, no dia 20, que a cúpula foi “muito menos dramática do que parecia”, e assegurou que as diferenças entre os dois líderes não eram tão grandes. “Creio que os norte-americanos conhecem as nuances de nossas posições”, acrescentou.

Entretanto, nem as declarações de Obama nem as do porta-voz do governo de Israel nos Estados Unidos, indicando que se tratava de “diferenças entre amigos”, tranquilizaram a opinião pública israelense. Com esses amigos, quem precisa de inimigos, disseram muitos comentaristas. Mas, afinal, quais seriam essas “nuances de posição” que provocaram a ira do primeiro-ministro israelense? Como afirmou um desconcertado funcionário do Departamento de Estado, o discurso de Obama foi “bom para Israel e certamente bom para a visão que Netanyahu tem de Israel”.

Diretamente, Obama rechaçou os esforços em marcha para que a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas reconheça a Palestina como Estado independente em sua sessão de setembro. Além disso, exigiu dos palestinos que expliquem o acordo de reconciliação alcançado semanas atrás entre o partido secular Fatah e o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica), e cobrou uma “resposta crível” para as “dúvidas legítimas” que surgem diante da negativa de a organização muçulmana reconhecer o Estado de Israel.

Obama também adotou a doutrina de segurança de Netanyahu para uma Palestina “não militarizada” e a idéia de uma “uma retirada progressiva” dos territórios ocupados. Como se não bastasse, o que o presidente não disse foi bom para o líder israelense. Não exigiu um novo congelamento na construção de colônias judias na Cisjordânia, apesar de Israel acabar de aprovar oficialmente a construção de 1.500 novas unidades habitacionais em Jerusalém oriental.

Também, nem mesmo mencionou a Iniciativa de Paz Árabe de 2002, defendida especialmente pela esquerda israelense, que propõe a retirada de Israel de todos os territórios ocupados, o reconhecimento do Estado palestino independente com Jerusalém oriental como capital, e uma “justa solução” para a situação dos refugiados palestinos. Então, o que indignou tanto Netanyahu?, perguntam alguns israelenses, assustados pela possibilidade de um crescente afastamento de Washington.

O primeiro-ministro parece que quis criar uma disputa artificial, rechaçando totalmente o princípio de “intercâmbio de terras” e o conceito de “Estado judeu”, manejados por Obama. O presidente havia alertado que se o governo de Netanyahu continuasse expandindo suas colônias teria pela frente “milhões de árabes” e custaria a Israel continuar sendo um verdadeiro “Estado judeu, a menos que houvesse um acordo de paz”.

Mas, em última instância, fixar as fronteiras sobre as existentes antes da Guerra dos Seis Dias, de 1967, com um “intercâmbio de terras”, permitiria a Israel em um futuro acordo reter grandes áreas de assentamentos que ocupou na Cisjordânia nas últimas quatro décadas. E se Israel é reconhecido “Estado judeu e pátria do povo judeu”, significa que todos os palestinos em seu território teriam de se mudar para zonas palestinas, uma demanda-chave israelense. “Não creio que Obama dissesse ser necessário regressar às fronteiras de 1967, mas sim que devemos iniciar a discussão com base nesses limites”, disse Barak.

Na realidade, o verdadeiro problema de Netanyahu está na sincronização dos elementos de um eventual acordo de paz. Obama sugeriu que as futuras negociações deveriam lidar inicialmente com os temas de segurança e a dimensão territorial do conflito. Outros assuntos, como “o futuro de Jerusalém e o destino dos refugiados palestinos”, seriam tratados em uma etapa posterior. Os israelenses temem que esta ordem crie nos fatos um acordo interino que nunca resolva os pontos. Enrolado com a bandeira nacional e com a direita apoiando, Netanyahu tenta desarticular este enfoque de Obama, procurando demonstrar sua pouca efetividade.

Afirma-se que um bom ataque é a melhor defesa, e Netanyahu implementou este célebre ditado. Sua quase ofensiva conduta na Casa Branca teve o objetivo de neutralizar a ampla visão norte-americana do direito de autodeterminação dos povos no Oriente Médio, com a esperança de reduzir a aspiração palestina à sua independência. 

Fonte: Envolverde





É pouco provável que Obama enfrente as questões reais do Oriente Médio


19/5/2011, Robert Fisk, The Independent, UK

OK, então lá vai o que o presidente Barack Obama deveria dizer em discurso sobre o Oriente Médio: Vamos sair amanhã do Afeganistão. Vamos sair amanhã do Iraque. Vamos parar de dar apoio covarde incondicional a Israel. Os EUA forçarão os israelenses – e a União Europeia – a pôr fim ao sítio de Gaza. Suspenderemos todos os fundos que Israel espera receber de nós, até que acabe, completamente, sem condições, a construção de colônias em terras roubadas aos árabes que nunca pertenceram a Israel. Poremos fim a todos os negócios e cooperação com os ditadores viciosos do mundo árabe – seja saudita, sírio ou líbio – e apoiaremos a democracia também nos países nos quais os EUA têm interesses comerciais massivos. Ah! E, sim, conversaremos com o Hamás, claro.


Evidentemente o presidente Obama não dirá nada disso. Arrogante e covardemente, só falará sobre os “amigos” que o ocidente teria no Oriente Médio, sobre a segurança de Israel – e “segurança” é palavra que Obama jamais usou ao falar da Palestina – e enrolará e enrolará sobre a Primavera Árabe, como se, algum dia, tivesse dado algum apoio a alguma democracia no Oriente Médio (antes, claro, de os ditadores já estarem em fuga); como se – quando mais precisaram do apoio de Obama – Obama tivesse oferecido a ajuda moral de sua autoridade ao povo do Egito. E que ninguém duvide: Obama falará também muito sobre um grande Islã religioso (mas nunca muito grande, ou os Republicanos recomeçam a exigir a certidão de nascimento de Barack Hussein Obama). Temo que ouçamos também – ah, sim, temo! – um convite-comando para que viremos a página de Bin Laden, para “dar o assunto por encerrado” e “seguir avante” (convite-comando que, também temo, o Talibã não aceitará).

Mr. Obama e sua igualmente desfribrada secretária de Estado não têm ideia do que enfrentam no Oriente Médio. Os árabes perderam o medo. Estão fartos de nossos “amigos” e enojados de nossos inimigos. Breve, os palestinos de Gaza marcharão sobre as fronteiras de Israel e exigirão o direito de “voltar para casa”.

No domingo, já se viram sinais disso nas fronteiras da Síria e do Líbano. O que farão os israelenses? Matarão palestinos aos milhares? E o que dirá então Mr. Obama? (Claro, exigirá “contenção dos dois lados”, frase que aprendeu do seu torturante predecessor).

Penso que os norte-americanos sofrem do mesmo mal que os israelenses: acreditam cegamente nos seus próprios argumentos de autoengano. Os norte-americanos continuam a falar da bondade do Islã; os israelenses, de como entendem “a mente árabe”. Mas não entendem coisa alguma. 

O Islã, como religião, nada tem a ver com isso, como tampouco o Cristianismo (palavra que não tenho ouvido nos últimos tempos) tem algo a ver com isso, ou o Judaísmo. Trata-se agora de dignidade, honra, coragem, direitos humanos – qualidades que, noutras circunstâncias, os EUA sempre elogiam –, que os árabes entendem agora que também lhes cabem. E estão certos. 

É hora de os norte-americanos livrarem-se do medo que lhes inspiram os lobbyistas  pró-Israel – de fato, são lobbyistas pró-Likud – e a repugnante acusação de antissemitismo que repetem contra qualquer um que se atreva a criticar Israel. É hora de os norte-americanos aprenderem a ter coragem, como a valente comunidade de judeus norte-americanos que protestam contra as injustiças cometidas por Israel e líderes árabes.


Mas nosso presidente favorito jamais dirá em seu discurso qualquer dessas verdades. Podem esquecer. Não passa de presidente bico-doce, que diz qualquer coisa, e que deveria ter devolvido – esquecemos? – seu Prêmio Nobel, porque nem Guantánamo conseguiu fechar; imaginem se conseguirá construir alguma paz! 

E o que disse ele no discurso do Nobel? Que ele, Barack Obama, tinha de viver no mundo real; que não é Gandhi... Como se – e honra ao The Irish Times, por ter sabido ler – Gandhi não tivesse combatido contra o império britânico! Assim sendo, seremos como sempre ensaboados pelas análises de sempre nos EUA, que elogiarão a fala do presidente, essa conversa fiada miserável.


Depois, virá o fim de semana em que Mr. Obama falará à conferência anual do AIPAC, o mais poderoso “amigo” de Israel nos EUA. E começará tudo outra vez, segurança, segurança, segurança; rápida – se acontecer – referência às colônias israelenses na Cisjordânia; e, isso eu garanto, muitas e muitas referências a terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo, terrorismo. E, sim, mencionará o assassinato (para não usar a palavra execução) de Osama bin Laden.

Mas o que Mr. Obama não entende – e Mrs. Clinton, essa, então, não faz nem ideia – é que, no novo mundo árabe, já não se trata de confiar em ditadorezinhos e seus asseclas. Que basta de bajulação. A CIA deve andar carregando malas cheias de dinheiro para distribuir, mas suspeito que poucos árabes se animarão a tocar nesse dinheiro. 

Os egípcios não mais tolerarão o sítio de Gaza. Nem, creio, os palestinos. Nem, tampouco, os libaneses, e nem os sírios, depois que se livrarem dos chefetes que os governam. Os europeus perceberão antes que os norte-americanos – estamos, afinal de contas, mais próximos do mundo árabe –, e duvido que continuem a admitir que a vida de todos continue a ser guiada pela indiferença acovardada com que os norte-americanos insistem em não ver o roubo de terras de que os israelenses fizeram meio de vida.


Tudo isso, claro, será como deslocamento vertiginoso de placas tectônicas para os israelenses – que deveriam estar elogiando e congratulando-se com os vizinhos árabes e com os palestinos, por se terem reunificado e unificado a causa; e que deveriam estar demonstrando solidariedade e amizade aos vizinhos árabes, em vez de medo. 

Faz tempo que minha bola de cristal partiu-se. Mas lembro bem do que Winston Churchill disse em 1940: “o que o general Weygand chamou de batalha pela França, acabou. Começa agora a batalha pela Grã-Bretanha.”



Traducao: Coletivo Vila Vudu

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