O grupo brasileiro na 2ª Missão de Solidariedade ao Povo Palestino participou nesta sexta-feira (19) do tradicional protesto de Bil’in, na Cisjordânia, contra o muro segregador e contra a ocupação israelense dos territórios palestinos. Os membros das entidades integrantes do Comitê pelo Estado da Palestina (CEP), que organiza a missão, também se encontraram com autoridades e famílias de prisioneiros políticos palestinos.
Na manhã desta sexta, a missão dirigiu-se à vila de Bil’in, a menor vila palestina, próxima de Ramallah, para participar nos protestos realizados todas as sextas-feiras contra o "muro da vergonha", que corta a Cisjordânia com cerca 800 quilômetros de concreto, separando famílias das suas terras de cultivo e dificultando a vida dos palestinos em trânsito, alegadamente por “motivos de segurança”.
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2ª Missão de Solidariedade ao Povo Palestino participa do protesto de Bil'in
contra o muro segregador construído por Israel na Cisjordânia. Foto: Rafael Oliveira |
No protesto, a missão acompanhou o grupo palestino rumo ao muro, onde já estavam posicionados soldados israelenses e judeus ortodoxos, habitantes da colônia vizinha, protegida pelo exército israelense, dentro do território palestino. Os protestantes manifestaram-se contra o governo sionista de ocupação e contra a usurpação dos recursos palestinos por Israel.
Em resposta, os soldados israelenses atiraram bombas de gás lacrimogêneo, bombas de som e gás de pimenta, pelos quais os membros da missão, que levavam bandeiras palestinas, brasileiras e das entidades que integram também foram afetados, enquanto parte do protesto.
Segundo organizadores, esta é a programação habitual das sextas-feiras, quanto jovens que lançam pedras e exigem dignidade, em revolta contra o governo militar israelense que os controla, são covardemente correspondidos pelos soldados com esses recursos.
Também compareceram ativistas internacionais de várias nacionalidades e israelenses que apoiam a causa palestina, opondo-se à ocupação e a opressão do seu governo sobre o território e o povo palestino.
Para preparar-se para o protesto, a missão encontrou-se com Abdallah Abu Rahma, coordenador do Comitê de Luta Popular, que organiza os protestos desde 2005. A construção do muro israelense na Cisjordânia completa já 10 anos, e os comitês de resistência popular, que se organizam em diversas vilas, embora com uma luta unificada, continuam protestando e pensando em novas estratégias.
Uma delas, como exposto por Abu Rahma, é a escolha pelo método de luta e resistência não-violenta, que vem angariando adeptos em diversos movimentos de resistência popular pelo mundo. Abu Rahma esteve na liderança da Primeira Intifada Palestina, iniciada em 1987, e conta que a resistência não-violenta vem ganhando cada vez mais força desde então.
Apesar disso, ele já foi preso pelas autoridades israelenses quatro vezes, e chegou a ficar encarcerado por um ano e meio, através de frágeis testemunhos sobre o seu envolvimento nos protestos. Muitos desses testemunhos foram conseguidos pelas forças israelenses com crianças que detiveram por até dois dias, e como indicado e até exigido pelos interrogadores, o papel de Abu Rahma na organização dos protestos e no fornecimento de materiais foi relatado.
O muro segregador unifica os comitês populares
Abu Rahma explica a tática usada pelo comitê como uma forma abrangente e bem estruturada de luta, oferecendo cursos de direito internacional e de resistência não-violenta, por exemplo, e trabalhando com advogados pela causa contra o muro e contra a ocupação israelense.
Na busca por uma postura mais ativa, por exemplo, o coordenador exibiu vídeos à missão sobre a construção instantânea de uma vila, Bab Al-Shams (Porta do Sol), em um território na Cisjordânia que já estava nos planos da ocupação sionista. Em três horas, como um vídeo que ficou internacionalmente conhecido mostra, um grande grupo de palestinos montou uma vila de tendas, com o apoio de ativistas internacionais. Segundo Abu Rahma, a atenção midiática trabalhou significativamente a favor da iniciativa.
Um exemplo da importância da atenção midiática, segundo ele, foi dado quando estava em cativeiro e recebeu a notícia de que, devido à atenção que havia ganhado internacionalmente, atores famosos e a própria secretária de Relações Exteriores da União Europeia (UE), Christine Ashton, declarou-o defensor dos direitos humanos. Com isso, representantes da organização acabaram por comparecer ao julgamento de Abu Rahma, o que resultou numa pressão positiva sobre o caso.
Ainda assim, em 2007 o muro foi considerado uma construção ilegal por uma decisão judicial israelense, mas passaram-se quatro anos até que a sua construção fosse desviada dos planos originais, para evitar a área. Através desta decisão, contudo, ao invés de perderem 58% das suas terras com a construção do muro que os separaria delas, conforme os planos originais, os residentes da região de Bil’in ainda perderam 25% delas para a ocupação israelense.
“O que fazemos agora é trabalhar a terra, depois de destruída pelo exército israelense, que arrancou árvores e destruiu tudo”, disse Abu Rahma, que lembra que os protestos têm sido bem-sucedidos mesmo que “ os soldados tenham feito muito para tentar parar os comitês, ‘experimentando’ armas, usando os nossos corpos”. Ele menciona o uso de novas balas de borracha, novos tipos de gás de efeito moral, bombas de som, de produtos químicos altamente nocivos, entre outros.
Além disso, como muitos outros palestinos, Abu Rahma denuncia o hábito de os soldados israelenses invadirem as casas palestinas durante a noite, “assustando as nossas famílias, destruindo coisas, assustando as crianças, que acordam com soldados usando máscaras pretas dentro de casa”.
Nos protestos, de acordo com o coordenador, 1.500 pessoas ficaram feridas e duas pessoas foram mortas: em 2007, Bassem Abu Rahma, que foi atingido no peito com uma bomba de gás lacrimogêneo e morreu instantaneamente, e dois anos depois, a sua irmã Jawaher também morreu nos protestos, por intoxicação.
Entre os protestos de ação não-violenta, para além da construção de vilas como Bab Al-Shams, os treinamentos em direito internacional e resistência e a parceria internacional, Abdallah Abu Rahma também menciona a obstrução de estradas segregadoras, construídas pelos e para os israelenses que ocupam os territórios palestinos, mas que não podem ser usadas pelos próprios palestinos.
Famílias em resistência
Em Nabih Saleh, vila que fica na “Área C” da Cisjordânia, segundo os Acordos de Oslo da década de 1990 (em que os israelenses têm o controle militar efetivo), Basim Tamimi, também detido pela ocupação israelense, recebeu a missão brasileira para contar sobre os protestos realizados na região.
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Neijar Tamimi, Basim Tamimi e Manal Tamimi exibem a camiseta da 2ª Missão de Solidariedade
Internacional ao Povo Palestino, em encontro em Nabih Saleh, Cisjordânia- Foto: Rafael Oliveira |
Sua casa está na lista israelense para a demolição, o que pode acontecer a qualquer momento, apesar de lá viverem várias pessoas de sua família. Mesmo assim, Tamimi fala da importância de “deslocalizar” a luta, “que é contra a ocupação; lutamos juntos entre as vilas”.
O ativista também exibiu vídeos de protestos realizados recentemente, de incursões ilegais e ataques das forças policiais israelenses contra casas palestinas. A casa de Tamimi chegou a ser alvo de ofensivas criminosas quando soldados lançaram bombas de gás para dentro, mesmo quando lá estavam crianças e mulheres.
Manal Tamimi, esposa de Basim, também comenta um vídeo em que teve de remover as crianças, junto com outras mães na casa, através das janelas, para fugir dos efeitos do gás. Além disso, conta do episódio da prisão de um garoto de 10 anos que foi interrogado e torturado, detido por 72 horas, para dar informações sobre os líderes ativistas da região.
Manal mostrou procedimentos da polícia israelense nas prisões violentas que fazem diante das famílias, traumatizando crianças e humilhando indivíduos e comunidades. Além disso, também falou dos constantes avanços tecnológicos usados pelo exército israelense contra os protestantes, mencionando o uso de produtos químicos e lança-granadas altamente eficientes, que disparam bombas de gás lacrimogêneo muitas vezes aleatoriamente.
“Uma vez tentamos contar quantas bombas de gás tinham sido lançadas, e chegamos a cerca de 1.500 em apenas uma sexta-feira”, disse Manal.
Prisioneiros palestinos em luta pela liberdade
Foto: Rafael Oliveira
No mesmo dia, a missão também esteve na vila Kober, de onde é um dos prisioneiros palestinos mais influentes da atualidade, Marwan Barghouti, e um membro da Federação Árabe-Palestina do Brasil, integrante do CEP, Ualid Rabah, cuja família recebeu a missão com um jantar e uma reunião sobre os prisioneiros políticos palestinos.
A esposa de Barghouti, Fadwa Barghouti, também compareceu para falar da campanha que organiza pela libertação de Marwan, que está detido há já 11 anos. A Campanha pela Libertação de Marwan Barghouti já é internacional, mas recebeu e declaração de compromisso das entidades brasileiras integrantes da missão, que debaterá sobre a criação de uma campanha de peso no Brasil.
Também presentes estavam os prisioneiros retratados no Guiness, o livro dos recordes: as pessoas que passaram mais tempo detidas e que ainda estão vivas, pois cumpriram 34 anos de prisão. Ambos contaram as suas histórias e o impacto que o encarceramento tem não só na vida dos presos, mas também de suas famílias e comunidades. Membros da missão intervieram para declarar solidariedade e apoio à luta palestina pela liberdade, e para explicar a forte ligação das suas entidades com a causa palestina.
A 2ª Missão de Solidariedade ao Povo Palestino está na Palestina para conhecer a realidade do conflito e da ocupação sionista que já dura mais de seis décadas, e para encontrar-se com membros de organizações sociais e da Autoridade Nacional Palestina (ANP), com o objetivo de reafirmar a solidariedade brasileira e informar os brasileiros sobre a questão palestina.
O compromisso de continuidade das missões de solidariedade e com as campanhas palestinas pela liberdade dos presos políticos, contra a ocupação israelense e pela criação de um Estado palestino independente e soberano foram uma das marcas dos encontros que o grupo teve nesta sexta-feira.
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