Os palestinos marcam, nesta quinta-feira (15), o Dia da Nakba, a Catástrofe. São 66 anos desde a criação do Estado de Israel, baseado na ideologia colonialista, fundada sobre um nacionalismo religioso artificial que forçou centenas de milhares de árabes ao exílio e à morte, inaugurando um longo período de ocupação militar e opressão. O Portal Vermelho conversou sobre a Nakba com representantes palestinos e do movimento judeu contra o sionismo.
Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho
Como parte do memorial, vários grupos participaram de marchas pelas ruínas de vilas destruídas durante a colonização israelense, na Cisjordânia palestina, na última semana. Nas manifestações desta quinta-feira (15), fontes locais denunciaram a morte de dois palestinos pelas forças israelenses. Muhammad Audah Abu al-Thahir, de 22 anos, e Nadim Siyam Nuwarah, de 17, ambos de vilas próximas à sede administrativa da Palestina, a cidade de Ramallah, foram atingidos com munições letais no peito, uma amostra da fatalidade da repressão contra os palestinos em suas próprias terras.
Cerca de 530 vilas (embora apenas 418 tenham sido oficialmente registradas) foram arrasadas por grupos sionistas de atuação terrorista, organizados principalmente contra a gestão britânica, enquanto potência colonial na Palestina, até 1947. Por isso é que, para os israelenses, o motivo de comemoração foi o evento que caracterizam como uma vitória contra as tropas britânicas durante a Guerra de 1948 e a “independência de Israel”, após os episódios que mudaram significativamente o mapa da região.
Assim, uma das principais bandeiras levantadas pelos palestinos é a do direito dos refugiados ao retorno - luta da qual o maior símbolo são as chaves guardadas, de casas em grande parte já destruídas - conforme previsto pelo direito internacional e, especificamente, pela resolução 194 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de dezembro de 1948.
Assim, uma das principais bandeiras levantadas pelos palestinos é a do direito dos refugiados ao retorno - luta da qual o maior símbolo são as chaves guardadas, de casas em grande parte já destruídas - conforme previsto pelo direito internacional e, especificamente, pela resolução 194 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de dezembro de 1948.
A criação do Estado de Israel foi um grande projeto colonizador impulsionado desde a Europa, assentado na ideologia sionista, que foi propagada no fim do século 19. Esta é a conclusão de diversos estudiosos, inclusive historiadores judeus (Ilan Papé, Shlomo Sand e muitos outros) e palestinos, como o acadêmico Edward Said. Não foi novidade, neste caso, o uso da religião ou das diferenças identitárias enquanto ferramentas mobilizadoras para o objetivo político de colonização.
Em documento divulgado pelo Departamento de Assuntos das Negociações da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), por ocasião da Nakba, estima-se que cerca de 800 mil pessoas – ou quase 67% da população, em 1948 – foram expulsas das suas terras, tornando-se refugiadas. “Até os dias de hoje, Israel ainda não reconheceu a sua responsabilidade pelo papel que desempenhou na criação e perpetuação da Nakba,” elaborada especificamente através do chamado Plano Dalet, pela milícia sionista Haganah, de acordo com o documento da OLP, após a resolução das Nações Unidas sobre a partilha da palestina, aprovada em 29 de novembro de 1947. Aproximadamente 15 mil palestinos foram mortos nas operações de “limpeza” de locais como Jerusalém e a cidade de Jaffa, além de centenas de vilas.
Em documento divulgado pelo Departamento de Assuntos das Negociações da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), por ocasião da Nakba, estima-se que cerca de 800 mil pessoas – ou quase 67% da população, em 1948 – foram expulsas das suas terras, tornando-se refugiadas. “Até os dias de hoje, Israel ainda não reconheceu a sua responsabilidade pelo papel que desempenhou na criação e perpetuação da Nakba,” elaborada especificamente através do chamado Plano Dalet, pela milícia sionista Haganah, de acordo com o documento da OLP, após a resolução das Nações Unidas sobre a partilha da palestina, aprovada em 29 de novembro de 1947. Aproximadamente 15 mil palestinos foram mortos nas operações de “limpeza” de locais como Jerusalém e a cidade de Jaffa, além de centenas de vilas.
Instrumentalizar a religião
O rabino Dovid Feldman, da organização "Judeus Unidos Contra o Sionismo", disse ao Vermelho que as elites sionistas “interpretam falsamente” seus textos religiosos para justificar as suas agendas. Os sionistas, disse o rabino, “lançaram uma guerra para tomar a terra e expulsar os palestinos. Os judeus acreditam em justiça, decência e respeito propriedade alheia. Os sionistas roubaram a terra dos palestinos e construíram seu Estado sobre ela.” Além disso, os colonos que se instalam ilegalmente nos territórios palestinos “também usam o judaísmo para aprofundar seus crimes,” continua.
O rabino comentou sobre os judeus ortodoxos que ainda não são obrigados a servir o Exército israelense, uma questão em intenso debate atualmente, no país. Para ele, a busca por integrar a comunidade ortodoxa à conscrição é uma tentativa de emprestar maior caráter religioso ao Estado de Israel.
“Estas são as formas com que os sionistas usam o judaísmo para se legitimarem. Assim, expulsam os palestinos porque almejam um Estado judeu, mas a terra em que o estabeleceram, em 1948 (quase 80% da Palestina) tinha mais árabes do que judeus. Com uma maioria de árabes, como poderiam estabelecer um Estado judeu?”
“Esperamos pelo dia em que esse estado chegue a um fim pacífico, quando todos os palestinos sejam livres para retornar aos seus lares e judeus e árabes vivam novamente como vizinhos na Palestina e em todo o Oriente Médio, como fizeram há séculos.”
Resistência e luta pela libertação
Abdallah Abu Rahma, coordenador do comitê de luta popular da vila da Bil’in, também explicou ao
Vermelho o esforço de resistência dos palestinos em suas terras, contra a expansiva ocupação israelense.
“A violação do direito internacional humanitário é exemplificada pela construção do Muro de Apartheid e a política de confiscação das nossas terras para a construção de colônias”, disse Abu Rahma. O coordenador refere-se ao projeto de um “muro de segurança”, como denominado pelo governo israelense, que, quando completo, deve alcançar cerca de 800 quilômetros de extensão, com oito metros de altura, engolfando porções significativas da Cisjordânia palestina. O comitê popular realiza protestos semanais contra o muro, quando também denuncia a repressão israelense, que lança bombas de efeito moral e detém ativistas com violência, muitas vezes de forma arbitrária e com acusações vagas.
O projeto foi do muro lançado em 2002 e a construção já alcançou cerca de 700 km, mas foi detida por alguns períodos devido à pressão de grupos como o comitê popular de Bil’in, que contestou na justiça a captura de 58% da área da vila, reduzindo a perda a 28% do território, por decisão emitida em 2007, acatada em 2011.
“Até agora, são contínuas as violações de Israel, com a morte de civis e a detenção de crianças e mulheres, além dos ataques dos colonos aos agricultores, às mesquitas, às propriedades. Por tudo isso, continuamos lutando para deter a ocupação e as violações, através da nossa resistência não violenta.”
Solidariedade e dignidade
Durante um recital de poesias em homenagem ao povo palestino, organizado pelo Comitê pelo Estado da Palestina (CEP) em São Paulo, nesta quarta-feira (14), o embaixador Ibrahim Al-Zeben, que representa a Palestina no Brasil, disse ao Vermelho: “São 66 anos em que a chama da luta pelo direito seguirá acesa, neste ciclo que foi interrompido com a criação do Estado de Israel e a sua negação à criação do Estado palestino, conforme definido pela ONU há 67 anos,” em 1947.
“Para nós e para todos os que lutamos pela justiça, com o tempo, a ocupação e a arbitrariedade de Israel não impede o nosso povo de continuar fazendo todo o possível, tudo o que está ao seu alcance para recuperar o seu direito a uma vida em território pátrio,” afirmou.
Israel, continuou o embaixador, “fez tudo o que pôde para impedir que a identidade palestina seja restaurada. Com isso, ocupou territórios, cometeu massacres, destruiu vilas, assassinou líderes, mantém presos mais de cinco mil lutadores pela liberdade, armou um Exército visível e invisível em todo o mundo, para impedir que o povo palestino não seja reconhecido.”
“Mas a força da justiça e do direito está vencendo, lentamente. Estamos conquistando aqueles espaços que nos correspondem. O que marca, realmente, é o fato de termos que esperar 66 anos para alcançarmos isso. O preço tem sido muito elevado, com o impacto nacional, com a destruição das nossas bases socioeconômicas, enfim. Pagamos um preço alto, mas a luta é esta. Cabe a nós, como palestinos, enfrentar este fenômeno, o mais desastroso dos séculos, me parece: a limpeza étnica.”
Por outro lado, o embaixador saudou, em discurso no evento do CEP, a solidariedade crescente à causa palestina, especialmente no Brasil. Al-Zeben garantiu: “o povo palestino está confiante de que o futuro nos pertence. A paz será alcançada e esperamos que seja o mais breve possível, para evitar mais derramamento de sangue, mais desperdício de energias nacionais, tanto dos palestinos quanto dos povos árabes, dos nossos amigos em todo o mundo e também do povo israelense, que se dedica a uma posição de guerra que só leva a mais destruição.”
O embaixador ressalta, entretanto, o impacto generalizado sobre o povo palestino, “que paga muito mais caro” pelo estado das coisas. “Estamos sem pátria, sem paz, sem bases socioeconômicas, vivemos sob ocupação, perseguidos, presos. Esperamos poder recuperar nossa dignidade, nossa unidade nacional e o direito ao retorno. É absurdo e desumano continuarmos vivendo em campos de refugiados, em que alguns já o são pela quarta vez, como os da Síria, do Iraque ou do Líbano. Ao longo desses 66 anos, os palestinos viveram um refúgio atrás do outro e esta agonia precisa terminar, temos de recuperar os nossos direitos a uma vida digna, em conjunto com todos os povos da região.”
No documento divulgado pelo Departamento de Assuntos das Negociações, a OLP também afirma que a Nakba “é uma história contínua de deslocamento, destituição e exílio. Israel precisa reconhecer a sua responsabilidade na criação e a perpetuação da questão dos refugiados. A Nakba continua a ser uma realidade para o povo palestino, e a sua negação por Israel não fará seus efeitos desaparecerem: apenas uma paz justa baseada no direito internacional pode curar as feridas abertas há 66 anos.”