sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Ataque contra o jornal satírico Charlie Hebdo: um ataque contra o islã

 Ataque contra o jornal satírico Charlie Hebdo 


Por Mohamad Hadjab

O ataque ocorrido esta quarta-feira 07 de janeiro contra o jornal satírico francês Charlie Hebdo não é só um ataque contra a liberdade de imprensa, e/ou contra o estado democrático de direito que a França encarna, mas, sobretudo um ataque contra os valores sagrados do Islã. Se nenhuma certeza comprova a origem islâmica dos autores desse atentado, ao gritarem "Deus é grande!" em árabe.. o mal foi feito.

Efetivamente, se os assassinos desse horrível atentado se expressaram em árabe por meio da expressão "Ala u akbar" (Deus é grande) enquanto acrescentaram querer vingar o profeta (Mohammed), foi o próprio islã, suas tradições, bem como seus valores que eles sujaram, atraiçoaram e assassinaram. Aqueles que são hoje e serão amanhã os principais reféns dessa barbaridade ocorrida na França são os membros da comunidade muçulmana (segunda maior religião praticada na França) que mais uma vez são injuriados, estigmatizados e acusados de todos os mais que se abaterão sobre a França como isso acontece já há mais de quinze anos. Na final das contas, a islamofobia é uma moeda política.

Os muçulmanos da França, sejam eles franceses ou residentes, devem manifestar sua indignação relembrando os fundamentos islâmicos, que são a paz e a tolerância. Aliás, o termo islã não contem o trilítero "Slm" que também originou a palavra árabe "Salam" que significa paz? Os mesmos muçulmanos devem cada vez mais se organizar na sociedade francesa à qual eles pertencem, defendo seu espaço dentro dela: eu farei minhas as palavras do pesquisador sociólogo argelino Abdelmalek Sayad : "Existir significa existir politicamente". Já chegou a hora desta frase escoar nos corações e mentes dos muçulmanos da França e do mundo inteiro antes de eles serem engolidos pela onda " à la mode" de islamofobia que não cessa de se estender na França e na Europa1 como isso já ocorreu nos anos 30 contra a comunidade judaica. Cada época precisa do seu bode expiatório e o islã foi designado em substituição ao judaísmo, comunismo ou outros!

Um dos principais sucessos literários nas livrarias francesas se chama "le suicide français" (O suicido francês) escrito pelo jornalista e ensaísta islamofóbico Eric Zemmour, que, numa entrevista dada ao jornal italiano "Corriere della Sera2" cogita a eventual deportação dos cinco milhões de muçulmanos vivendo no território francês. O escritor e premiado Michel Houellebeq que declarou que a religião mais babaca era o islã3, acabou de publicar uma obra intitulada "Soumission" (Submissão) que narra a chegada ao poder na França de um partido político muçulmano como se tratasse de uma novela profética exaltando o medo coletivo presente na França quando se trata do islã. Tantos sinais de alerta que mostram o quanto a islamofobia constitui um comércio lucrativo dentro de uma França que se afasta cada vez mais dos seus valores universais e entre eles a liberdade, a democracia, a separação do poder temporal e espiritual e também a liberdade de culto.

O jornal francês satírico 'Charlie Hebdo' - anteriormente libertário e anárquico - se tornou cada vez mais extremista e particularmente virulento contra os muçulmanos sob a nova direção de Philippe Val, acabou de perder bem como o país inteiro, seus melhores caricaturistas, sob as balas de assassinos. Eu não compartilho o humor e os ataques fáceis por meio de caricaturas contra os muçulmanos e sua religião, publicado pelo jornal francês sendo lucrativo, porém, como o fala essa frase geralmente atribuída ao filósofo das luzes Voltaire "Posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo". Mas isso não impede de afirmar que a liberdade também possui seus próprios limites.

Este ataque mostra o mal-estar social e econômico presente na sociedade francesa em relação a uma parte da sua população hoje em dia definida como muçulmana, e antigamente como árabe, cuja presença na França demonstra a relação ambígua que essa grande nação europeia mantém, não só com a outra margem do Mediterrâneo (Norte da África e, especialmente, com a sua ex-colônia Argélia), mas com parte da sua história feita de glória, conquista e miséria. As explosões racistas contra os muçulmanos se tornaram um esporte nacional na França, sendo que a maioria dessa comunidade ainda pertence ao Lumpen proletariado francês sem qualquer representação política ou econômica que lhe permite defender-se ou influenciar o debate político local. Se a França deve proceder a um verdadeiro exame de consciência sobre a colocação do árabe e do Islã no imaginário francês desde o século VIII, os muçulmanos devem reagir, lutando pela defesa dos seus direitos, mas também mostrando indignação quando radicais se substituem a eles cometendo o irreparável. Caso contrário, a situação pode piorar alargando o fosso e a incompreensão entre cidadãos levando a nação ao que mais desejam os inimigos da república: a um choque de civilizações.


MOHAMMED HADJAB

Especialista em Relações Internacionais.



1 http://noticias.r7.com/internacional/movimento-pegida-convoca-manifestacao-islamofobica-em-oslo-07012015

2 http://www.francetvinfo.fr/societe/zemmour-envisage-la-deportation-des-musulmans-cazeneuve-condamne_774555.html

3 http://www.huffingtonpost.fr/2015/01/06/michel-houellebecq-islam-soumission-musulman-religion_n_6372084.html

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Bob Fernandes / O atentado na França... e os ódios no Brasil

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terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Direito internacional é a estratégia da Palestina, diz ex-chanceler

A estratégia da Organização para a Libertação da Palestina para contornar o impasse nas negociações com Israel é afirmar o Estado da Palestina como ator internacional, mas a responsabilização israelense por crimes de guerra também é prioridade. Em entrevista, o ex-chanceler Nabil Shaath explicou os avanços para a conferência entre Estados parte da Quarta Convenção de Genebra e a votação de uma resolução no Conselho de Segurança da ONU pelo fim da ocupação.

Por Moara Crivelente*, para o Vermelho


Confrontos no centro de Hebron
Soldados israelenses e palestinos em confrontos no centro de Hebron, Cisjordânia, em fevereiro, durante um protesto para marcar os 20 anos do massacre da Mesquita de Abraão e exigir a abertura da Avenida Shuhada, bloqueada desde então. Foto: AFP/Thomas Coex

“Estamos num esforço de três linhas principais”, explicou Shaath, por telefone, nesta segunda-feira (15): “A primeira é buscar o reconhecimento do Estado independe da Palestina nas fronteiras de 1967, com capital em Jerusalém Oriental, conforme as resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU).” Ao todo, 135 países já reconhecem o Estado da Palestina, inclusive oito europeus e os independentes da América Latina e Caribe, à exceção da Colômbia, Panamá e México.

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Shaath, que foi o chefe das negociações na OLP (1988-1997) e ministro das Relações Exteriores (1994-2006), pontua que isso “é uma forma de reafirmar legal e politicamente os direitos dos palestinos ao seu Estado.” Atualmente, ele compõe o Comitê Central da OLP e do partido Fatah. Sua experiência colocou-o em contato direto com o chamado “processo de paz de Oslo”, uma série de conferências para negociações e acordos mediados principalmente pelos EUA, durante a década de 1990. A assinatura do primeiro texto, a Declaração de Princípios, aconteceu em 1993.

Entrevista com ex-chanceler Nabil Shaath, da OLP e FatahPara o ex-chanceler, a estratégia empenhada pelos palestinos agora é uma alternativa ao impasse estrutural e aparentemente intransponível do “paradigma” enraizado nesse processo de paz. A mediação acabou dominada pelos Estados Unidos, aliados primários de Israel, sem qualquer amostra de intenção real de mudança ou superação do status quo. Durante os últimos 20 anos, o conjunto de acordos que deveriam ser temporários entranhou na Palestina as várias facetas da ocupação israelense, inclusive a proliferação das colônias ilegais e a construção de um muro de oito metros de altura, com mais de 700 quilômetros de extensão, anexando ainda mais porções da Cisjordânia restringindo a movimentação dos palestinos.

Os avanços da ocupação traçam a inviabilidade da chamada “solução de dois Estados”, o consenso internacional para o estabelecimento do Estado da Palestina, vizinho ao de Israel. Além disso, a restrição da movimentação dos palestinos, a segregação relativa aos colonos israelenses (com estruturas e permissões de mobilidade e leis distintas, por exemplo) e as detenções arbitrárias sujeitas à tortura e à falta de julgamentos por longos períodos são amostras das diversas violações da Quarta Convenção de Genebra, assinada em 1949 (inclusive por Israel), “relativa à proteção dos civis em tempos de guerra”.

Israel continua e as detenções arbitrárias de palestinosNo texto, as obrigações de uma “Potência Ocupante” estão bem definidas, mas Israel rechaça esta definição por completo, negando a classificação do regime que impõe sobre a Cisjordânia, a Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental, enquanto “ocupação”. Shaath explica: “os israelenses alegam que se tratam de territórios em disputa”, uma forma de esquivarem-se das obrigações estabelecidas pela Convenção. Para isso, mantêm uma narrativa religiosa “de quatro mil anos atrás” segundo a qual o “povo judeu merece” aquela terra. A manipulação da religião ou outras identidades para a colonização não é novidade no caso da Palestina, mas parece nunca ter durado e inculcado tanto.

Por outro lado, a mudança no cenário internacional, de um mundo unipolar dominado pelos Estados Unidos para a multipolaridade, tem impulsionado a questão palestina, continuou o diplomata. “Veja o que acontece com o Brasil, ou a América Latina, onde os países fortalecem suas democracias e sua soberania, como atores importantes no âmbito global.” Com a Europa, a Rússia, o Brasil e outros atores, diz Shaath, “temos a chance de mudar as coisas, tirando as negociações das mãos dos Estados Unidos, pressionando para tornar possível um acordo. Apenas com os EUA como facilitador não fizemos qualquer avanço em 20 anos, pelo contrário!”

 
Soldados israelenses vasculham veículos e revistam palestinos
Soldados israelenses vasculham veículos e revistam palestinos em um posto de controle próximo a Hebron, em junho, quando a "operação militar Guardião Fraterno" foi lançada na Cisjordânia. (Foto: Reuters)

O Parlamento Europeu prepara uma votação sobre o reconhecimento do Estado da Palestina. A Suécia foi o primeiro grande país da União Europeia a já afirmar o reconhecimento, enquanto Espanha, Portugal, França, Bélgica e Reino debatiam a questão em seus Parlamentos, com resoluções que pedem aos governos o reconhecimento já aprovadas. Para o ex-chanceler, a Europa reavalia suas posições porque a opinião pública tem pressionado os governos, principalmente depois dos 50 dias de bombardeios israelenses contra a Faixa de Gaza, em julho e agosto, que mataram cerca de 2.200 palestinos, devastando o estreito território sitiado pela terceira vez em cinco anos. Além disso, a violência intensificada também na Cisjordânia e Jerusalém Oriental revela o que é de fato um longo histórico de opressão sistemática, e não casos isolados de agressão. “As pessoas têm reconhecido a justiça da causa palestina por autodeterminação”, disse o diplomata.

Alternativas do Direito Internacional


Em 2001, quando Shaath ainda era o chanceler palestino, a Suíça já havia convocado uma conferência entre os Estados signatários das Convenções de Genebra de 1949 para discutir a situação na Palestina. O objetivo foi avaliar as violações israelenses, sobretudo com base na classificação de Israel como “Potência Ocupante” com obrigações. Diversos artigos da Quarta Convenção proíbem a deportação, transferência ou evacuação de habitantes, a destruição de propriedades, a mudança da demografia e a construção de colônias ou transferência da população do ocupante para os territórios ocupados. Também reforçam obrigações sobre o acesso a alimentos e remédios, assistência humanitária, condições de trabalho, condições dignas de vida, julgamentos justos, leis penais, tratamento dos detidos, entre tantos outros. Os artigos são praticamente descrições das violações perpetradas no regime israelense imposto aos palestinos em seus territórios. O Estatuto de Roma ao que os palestinos têm trabalhado para aceder, que constitutiu a Corte Penal Internacional (em vigor desde 2002), também define ações reconhecidas como "crimes de guerra":



Além disso, por exemplo, em 2004, o Tribunal Internacional de Justiça também emitiu uma Opinião Consultiva (demandada pela Assembleia Geral da ONU) em que afirmava: “a construção do muro erguido por Israel, a Potência Ocupante, no Território Palestino Ocupado, inclusive dentro e ao redor de Jerusalém Oriental, assim como seu regime associado [postos de controle, pedidos de permissão para movimentação, etc] são contrários ao direito internacional (...) e Israel é obrigado a cessar os trabalhos de construção (...), a desmantelar a estrutura ali situada e a repelir ou declarar sem efeito os atos legislativos ou regulatórios relativos a ela.”

A conferência de 2001 resultou num relatório de avaliação contundente sobre as violações israelenses, mas como em outras ocasiões, a pressão política enterrou o documento. Naquele momento, novos ensaios diplomáticos confrontaram-se com o aumento da violência na Cisjordânia, o nascer da segunda intifada (levante) palestina e a repressão israelense, com operações militares e invasões com tanques em campos de refugiados como o de Jenin, onde uma verdadeira batalha aconteceu entre os soldados israelenses e os movimentos da resistência palestina, taxados de “terroristas”, ainda que diversas convenções e resoluções também reconheçam o direito de povos como o palestino a lutar contra a dominação estrangeira “através de todos os meios disponíveis”.

Esta quarta-feira (17), porém, pode ser um dia importante. Além da Conferência entre a maioria dos 196 Estados partes das Convenções de Genebra (que Shaath garantiu ter angariado pleno apoio internacional apesar das pressões contrárias e oposição aberta de Israel, dos Estados Unidos, da Austrália e do Canadá), uma proposta de resolução com um prazo para o fim da ocupação israelense sobre os territórios palestinos também poderá ser votada no Conselho de Segurança da ONU. A proposta deve ser encaminhada nesta segunda-feira pela Jordânia e pela Palestina.



O Muro do Apartheid erguido por Israel, um muro da vergonha
O órgão já lidou com a questão palestina de forma majoritariamente negativa diversas vezes no passado, enquanto os EUA, membro permanente com poder de veto, barraram mais de 50 resoluções que condenariam a política israelense de ocupação. Ainda assim, em 1980, ano em que o governo israelense aprovou leis para a anexação da porção palestina de Jerusalém e de outros territórios ocupados (as leis omitem a palavra “anexação” para usarem os termos “extensão da jurisdição israelense”), a resolução 465 do Conselho de Segurança reafirmava de forma unânime a ilegalidade da construção de colônias israelenses nos territórios palestinos ocupados.

Shaath explica que a proposta de resolução palestina pede um prazo de dois anos para a retirada das tropas e das colônias israelenses (uma contraproposta da França transforma esta parte em um “período para a negociação de um estatuto final”), o estabelecimento do Estado independente da Palestina nas fronteiras de 1967 (anteriores à Guerra de Junho daquele ano, quando Israel avançou na ocupação de territórios palestinos e de outros vizinhos árabes), com Jerusalém Oriental como capital. Esta configuração inclui apenas 22% da Palestina histórica, numa concessão de 78% do território a Israel. É assim que 135 países já reconhecem o Estado palestino hoje, apesar das lacunas estruturais a serem superadas para a sua efetivação.

O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu refere-se às estratégias palestinas como “trapaças” e “agressões diplomáticas”. Seu governo já impôs sanções ao governo palestino, acusando-o de rejeitar as negociações, por exemplo, congelando o repasse dos impostos que recolhe pelas exportações palestinas. Netanyahu reuniu-se com o secretário de Estado dos EUA John Kerry em Roma, nesta segunda-feira, para pressionar contra a resolução. Kerry também deve reunir-se com chanceleres dos países árabes, que afirmaram apoio à estratégia palestina.

Enquanto movimentos massivos em diversos países fortaleceram a demanda contra a política israelense de ocupação da Palestina e das ofensivas reiteradas contra a Faixa de Gaza, a Cisjordânia e Jerusalém Oriental, os esforços no sentido do direito internacional são rechaçados pela liderança israelense ou apresentados quase como atos de guerra. Os apelos populares, inclusive dentro de Israel, pelo fim dessas políticas de um verdadeiro regime de apartheid, são temidos pelo governo israelense, apreensivo com a ideia de ver-se no banco dos réus, finalmente.


*Moara Crivelente é cientista política, jornalista e membro do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), assessorando a presidência do Conselho Mundial da Paz.

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