terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Israel é a premissa do ódio




31/01/2016 - por Breno Altman


A Folha de S.Paulo publicou, no último dia 24 de janeiro, no caderno Ilustríssima, elegante defesa do sionismo, assinada pelo jornalista Alon Feuerwerker e intitulada “Quatro premissas erradas sobre Israel”.

A síntese do postulado apresentado pelo autor está em frase clara, pela qual busca explicar obstáculos para a fundação do Estado palestino: “a ampla maioria dos líderes árabes e muçulmanos tem recusado qualquer solução de compromisso que inclua um Estado judeu”.

A assertiva camufla uma falácia: ao contrário do que afirma o escriba, a Organização pela Libertação da Palestina, desde 1993, quando foi assinado o Acordo de Oslo, reconhece a legalidade de Israel, somando-se ao ponto de vista advogado por Egito e Jordânia, entre outras nações árabes.

As lideranças palestinas, ao assumirem esta posição, aceitaram a fórmula da convivência pacífica e soberana de dois Estados, um árabe e outro judaico, como o mapa do caminho para a independência e a descolonização.

Sucessivos governos sionistas, no entanto, das mais distintas colorações partidárias, continuaram a política de ocupação dos territórios anexados à força nas guerras posteriores a 1947.

A Autoridade Palestina, criada após as negociações entre Yasser Arafat e Yitzhak Rabin, permanece estrangulada por um sistema militar e administrativo que impede sua plena soberania. Repartida em bantustões formalmente autônomos, localizados em territórios descontinuados, não tem controle sobre riquezas naturais, fluxos comerciais, estradas de passagem, política de defesa ou cobrança de impostos.

O Estado de Israel persevera em violação sistemática de resoluções internacionais que obrigam o recuo às fronteiras existentes até a guerra de 1967.

O texto de Feuerwerker aborda o tema como se fosse conflito entre dois Estados. Abusando da fantasia, traça paralelo com as tratativas que sedimentaram a paz entre França e Alemanha no século XX. A questão palestina tem outra natureza: expressa situação neocolonial, na qual uma nação invade e governa terras que não lhe pertencem, ditando o destino de outros povos e impondo seus interesses geopolíticos.

Ao longo de sucessivas batalhas de ocupação, o Estado de Israel ampliou sua posse sobre a antiga Palestina britânica, dos 53% determinados pela partilha original, até superar atualmente os 80%. Além das guerras de conquista, estabeleceu processo de usurpação e discriminação contra a população palestina, incorrendo em práticas de colonialismo frontalmente condenadas pela comunidade das nações.

À luz da norma internacional, Israel comporta-se como Estado pirata. De índole semelhante a da África do Sul durante o apartheid, no qual um regime de ordenamento racial protegia a supremacia branca.

Todos os povos submetidos a este tipo de garrote possuem o direito à rebelião, historicamente caracterizado como autodefesa diante da opressão estrangeira e do vilipêndio à liberdade.

Todos os governos que atropelam princípios estabelecidos pela carta fundacional das Nações Unidas e suas decisões correlatas devem ser pressionados e boicotados até que retomem a rota da legalidade.

Mesmo que seja longo o caminho para a derrota da doutrina expansionista, ao inverso do que esboça o respeitado jornalista, a responsabilidade pelo ódio é uma pena que sempre cabe ao agressor.


Esse artigo foi originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo, no dia 31/01/2016.(http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2016/01/1735262-israel-e-a-premissa-do-odio.shtml).



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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Empresa israelense oferece empregadas com valor tabelado por etnia

O racismo em Israel é parte de sua formação


Do Brasil 247 - por Plínio Zúnica*


O trabalho doméstico é, por si, um absurdo. Em Israel, porém, o absurdo ganha sempre novos limites, principalmente quando envolve a exploração de minorias étnicas, e com o trabalho doméstico não poderia ser diferente. Agora, na "única democracia do oriente médio", o valor da exploração do trabalho doméstico de uma mulher é tabelado por origem étnica.

"Precisa de uma empregada? Está cansado de ser multado por contratar imigrantes ilegais? Não quer contratar uma faxineira árabe por questões de segurança? Está cansado de seguir a lei e depois ser processado por empregados temporários?"


Esse é o texto no cabeçalho de um folheto publicitário que vem sendo distribuído nas vias mais movimentadas do norte de Tel Aviv, a cidade "mais progressista" de Israel. No dia 05 de fevereiro, a blogueira israelense Tal Schneider recebeu este panfleto e denunciou a empresa, que oferece serviços de diaristas e empregadas domésticas com valores diferenciados de acordo com a sua etnia.

A empresa oferece a "solução" para as aflições dos cidadãos israelenses, com um cardápio variado de mulheres para atender as necessidades e níveis de racismo de cada cliente. De acordo com o flyer, a empresa reconhece oficialmente que a carne mais barata do mercado é a carne negra, uma vez que contratar uma empregada doméstica vinda de países africanos custa 49,00 NIS (Shekel israelense, cuja cotação atual é de 1 para 1 com o Real). Uma empregada do Leste Europeu sai por 52,00 NIS por hora. Já a hora de trabalho uma empregada da parte ocidental da Europa custa 69,00 NIS, ou seja, uma mulher do "mundo civilizado" vale 40% mais do que uma africana.

O jornal israelense Mako entrou em contato com a empresa, que declarou que o anúncio é verdadeiro, que não há nenhum mal entendido, e que em Israel não é ilegal pagar salários diferentes por motivos raciais. Infelizmente, eles têm razão. A discriminação racial é legalizada em Israel, e casos como este não são nenhuma novidade na nação mais racista e xenófoba do planeta.

Não é nenhuma novidade que o apartheid racial é legalizado e amplamente normalizado na sociedade sionista. Um exemplo das leis que garantem o direito israelense de ser racista é o fato de que todo proprietário pode se recusar a alugar imóveis para não-judeus, e é muito comum que árabes e negros sejam considerados vizinhos indesejáveis. Pra além das medidas de racismo governamental, existem as práticas cotidianas de uma sociedade profundamente embriagada com a ideia de sua superioridade racial, como nos mostra o caso recente de dois palestinos que foram expulsos de um voo porque cerca de setenta israelenses se enfureceram com a ideia de dividir o seu precioso espaço com árabes. Ou podemos citar o caso de outubro de 2015, quando uma reportagem do Channel 2 de Israel revelou que os hotéis da rede Crown Plaza alertavam seus clientes israelenses de que, infelizmente, teriam que passar pelo inconveniente de terem que dividir as áreas comuns do hotel com árabes. Os exemplos são infinitos.

O racismo israelense não é novidade, porém é muito comum que se pense que o preconceito sionista seja apenas islamofóbico ou anti-palestino. A propaganda de doutrinação sionista costuma usar, muito desonestamente, a existência de judeus etíopes para alegar que não existe preconceito contra negros em Israel. O caso desta empresa, no entanto, é apenas mais um dos inúmeros exemplos que provam que a sociedade israelense não é apenas paranoica com "questões de segurança" e "terroristas muçulmanos". Israel é uma sociedade xenófoba e higienista, que não vê problemas em tabelar o valor de mulheres de acordo com a cor de sua pele e origem étnica, da mesma maneira que não vê problemas na existência de Holot, um campo de concentraçãono deserto do Negev, construído para encarcerar ilegalmente negros refugiados e depois deportá-los à força para destinos aleatórios. Afinal, colonização, racismo e exploração do trabalho são elementos indissociáveis, e o sionismo moderno não é nada mais do que a perpetuação do colonialismo europeu.


Para saber mais sobre o racismo israelense contra povos africanos, recomendo o site (em inglês) do jornalista David Sheen, que compila reportagens e relatórios de ataques sionistas contra populações negras.


*Plínio Zúnica - Estudante de Letras, viveu no Egito e na Palestina. Escreve também os blogs Descolonizações e Bebendo Blues. Contato: zuni.plinio@gmail.com 


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Matérias relacionadas com apartheid, racismo e xenofobia em Israel:



























terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

A falácia do diálogo com a academia israelense

Ilustração de Marlons Anjos


Do Blog JUNHO

Publicado originalmente no Counterpunch

Por Haim Bresheeth e Sherna Berger Gluck

(Tradução de Rejane Carolina Hoeveler)

Um argumento padrão contra o movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra a ocupação israelense – e especialmente contra o boicote acadêmico – tem sido a “necessidade de dialogar” com os israelenses. De fato, durante os 46 anos de ocupação, numerosos esforços para “dialogar” têm sido repetidamente feitos, todos os quais são calorosamente abraçados por Israel e suas instituições acadêmicas.

O exemplo mais recente é uma conferência de “História Oral Internacional” organizada pela Universidade Hebraica de Jerusalém, com a participação do renomado historiador oral italiano Alessandro Portelli. Os temas da conferência incluíam estudos sobre trauma, estudos sobre holocausto e estudos sobre conflitos, evitando assiduamente, no entanto, qualquer referência ao Nakba.[1]

Tal elipse típica se tornou uma zona de batalha icônica ente os apoiadores dos direitos palestinos e os pró-israelenses, os quais promovem o “diálogo” e o “compromisso”. Não surpreende que a Universidade Hebraica evite esse assunto, dada sua cumplicidade com o trauma palestino em curso. A recém aprovada Lei Nakba em Israel proíbe mesmo a celebração do Nakba, portanto essa nulificação é parte de um projeto maior de negação israelense.

Foram feitos esforços privados para dissuadir os dois conferencistas escalados, e tornou-se claro que eles subscreviam firmemente o valor do “compromisso”, mesmo com uma instituição como a Universidade Hebraica, cuja cumplicidade na violação dos direitos palestinos e da lei internacional estão completamente documentadas. Seguindo essa discussão, a página original da conferência foi trocada, e uma referência elíptica pareceu abrir a porta para alguma discussão para a Nakba anteriormente não mencionada.

As questões envolvidas nessa conferência vão além de uma mal informada ou mal guiada participação dos conferencistas escalados; uma chamada pública para boicotar a conferência, assinada por 72 acadêmicos internacionais, foi lançada em agosto. Agora, em apenas um mês, existem mais de 250 assinaturas, das quais um terço é de historiadores orais de 19 países, incluindo África do Sul, Brasil, Espanha e Índia.

Como a discussão posterior sobre o boicote foi cortada na lista de emails dos Estados Unidos, onde a conferência foi inicialmente anunciada, uma mensagem postada pela organizadora da conferência foi o último comentário substantivo sobre a questão. Nele, ela afirma que boicotar a Universidade Hebraica “apenas serve como um desserviço a muitos indivíduos, organizações e comunidades que dedicam suas vidas profissionais e pessoais para encontrar uma resolução justa para o conflito”.[2] Então, o argumento para o “compromisso” era permitido, mas à comunidade acadêmica americana era negado o acesso as evidências constrangedoras para o boicote. De fato, eles estavam dando uma resposta a uma questão ainda sequer debatida publicamente.

A disputa entre os acadêmicos, e a timidez daqueles nos Estados Unidos comparados com outros pelo mundo, não é nova. Mais do que isso, representa um conflito mais profundo, relativo à questão mesma do “compromisso”.


A insensatez do “compromisso”


Os acadêmicos têm ido a conferências em Israel, especialmente em Jerusalém, durante longas cinco décadas de ocupação, “dialogando” com seus pares israelenses. Já é ruim o suficiente que essas participações não tenham resultado em absolutamente nada de positivo, mas, para piorar, eles se tornaram parte mesmo da estratégia política israelense: mais participação, discussão, encontros, negociações entre os lados ad infinitum. A atual fase de tais exercícios infrutíferos recentemente iniciada pelo Secretário de Estado John Kerry vai provavelmente se juntar às demais na lata de lixo da História.

Pior ainda, sob a aparência de continuar discussões e negociações – uma tática de adiamento desenvolvida pelo Primeiro-Ministro Shamir nos anos 1980[3] – Israel conseguiu adicionar 700.000 colonos ilegais nos Territórios Ocupados da Palestina e da Síria. Isso equivale ao número de refugiados palestinos que foram forçados a sair da Palestina em 1948 pelas forças israelenses e nunca retornaram, apesar de inúmeras resoluções da ONU.

Em mais de seis décadas de existência, Israel desafiou a ONU em todas as mais cruciais resoluções aprovadas sobre os direitos dos palestinos; instalou ilegalmente colonos nos territórios; desafiou a Convenção de Genebra numerosas vezes, incluindo aí sua “falha” em proteger a população sob ocupação. Entre outras coisas, se recusou a dar às universidades palestinas o direito de operar, e fechou as instituições palestinas existentes por longos períodos. Durante todo esse tempo, ninguém na academia israelense pediu pela reabertura das universidades palestinas, ou pela restituição da liberdade acadêmica na Palestina. As universidades israelenses foram diretamente cúmplices da violação israelense dos direitos humanos palestinos e das leis internacionais, e todas colaboraram de alguma forma com a ocupação militar, incluindo aí assistência ao complexo industrial-militar.[4] No caso da Universidade Hebraica de Jerusalém, seu campus de Mt. Scopus foi expandido dentro de terra ilegalmente confiscada e ocupada.

No entanto, em contraste com o caso do apartheid sul-africano, a maioria dos acadêmicos pelo mundo permaneceu calada por anos, mostrando pouca oposição aos crimes de Israel. Somente em 2005, seguindo o chamado da PACBI por um boicote acadêmico, o BDS e o boicote acadêmico começaram a sério no Reino Unido. Desde então, o BRICUP (Comitê Britânico pelas Universidades na Palestina, na sigla em inglês) tem se envolvido em diversas ações de sucesso, incluindo a retirada do famoso físico Stephen Hawking da conferência presidencial de 2013 – uma ação que galvanizou cientistas e acadêmicos pelo mundo.[5]

Quatro anos após a fundação da BRICUP, e em resposta a Operação Cast Lead[6] campanhas tanto nos EUA (USACBI) quanto na França (AURDIP)[7] foram iniciadas. Seguidas ao sucesso do repúdio mostrado por Hawking, ambas campanhas tem sido ativas. Nos Estados Unidos, talvez o mais significativo sucesso no front acadêmico tenha sido a aprovação da resolução do boicote acadêmico na Conferência de Estudos Asiático-americanos em maio de 2013. A AURDIP, apesar de severamente dificultada pelas políticas repressivas iniciadas por Sarkozy e totalmente aplicadas sob Holland, permanece uma importante referência para o boicote acadêmico, regularmente utilizando eventos públicos de mostra de cooperação entre instituições acadêmicas de França e Israel como uma plataforma para promover o BDS.

Hoje, existem campanhas ativas de boicote na Espanha (PBAI), Berlim (BAB) e Índia (IncABCI), todas as quais foram iniciadas em 2010[8], e na Irlanda (AFP – Academics for Palestine) foi criada em 2012[9]. Talvez o mais importante desdobramento tenha sido o desenvolvimento de um movimento BDS dentro de Israel (Boycott from within – Boicote a partir de dentro). Essas campanhas de boicote têm angariado apoio crescente, freqüentemente de alguns dos mais notáveis acadêmicos em seus países e regiões, como Josep Fontana, o prestigiado historiador catalão. Os grupos de boicote na Espanha, Índia e Estados Unidos estão atualmente organizando contra parcerias sendo montadas com a Technion[10] de Israel. Mesmo na Alemanha, onde qualquer crítica a Israel é altamente suspeita, o BAB está desafiando um acordo de cooperação entre a Universidade Livre de Berlim e a Universidade Hebraica.

A mensagem está se espalhando, gradualmente penetrando as instituições acadêmicas em todas as partes. Em resposta, Israel e o movimento sionista têm devotado tremendos esforços, financiados pelo governo, para conter o boicote. A política de longo prazo que foi então idealizada priorizou o Reino Unido. Uma série de forças-tarefas feitas em universidades israelenses chegaram ao Reino Unido para “explicar” a necessidade de “compromisso” e “diálogo”. Os mesmos professores que por anos se puseram contra qualquer engajamento no apoio aos direitos civis e humanos dos palestinos, incluindo seu direito a educação, estavam agora militando em apoio a “real vítima” – Israel – e promovendo o “compromisso” com as forças de ocupação sob a bandeira do diálogo. A mais recente tentativa, certamente não a última, é a campanha do governo para usar os estudantes israelenses contra o boicote. Revelações recentes expuseram a criação de unidades disfarçadas nas universidades israelenses, criadas para trabalhar com a União Estudantil Nacional Israelense, usando as mídias sociais.[11]

Seja o que for que se pense sobre as universidades israelenses, elas não podem ser acusadas de serem liberais ou apoiadoras de direitos humanos. Alguns meses antes da incursão em Gaza em dezembro de 2008, uma petição pela liberdade acadêmica nos Territórios Ocupados circulou entre mais de 10.000 acadêmicos israelenses. Essa moderada petição, que requeria meramente o governo a permitir que os palestinos desfrutassem da mesma liberdade que os acadêmicos israelenses, foi assinada por apenas 407 deles – 4% do total. As associações acadêmicas em Israel nem mesmo a discutiram. Embora a Universidade de Tel-Aviv seja de longe a mais “liberal” de todas, com 155 membros assinando a petição, em 2012, Shlomo Sand[12] se sentiu compelido a repreender seus colegas no Departamento de História por ocultarem a problemática história de sua própria universidade, construída na antiga vila palestina de Sheikh Muwanis.[13]

Os acadêmicos israelenses continuamente ignoram os chamados da sociedade civil palestina pelo BDS contra a ocupação agressiva de Israel, argumentando pelo “diálogo” com os colegas israelenses. De fato, a conferência na Universidade Hebraica é promovida como um “local de participação no qual ‘diálogos difíceis’ sobre memória e perspectivas serão discutidos”. Como de costume, ao invés de promover diálogo com os acadêmicos palestinos, o máximo que os organizadores conseguem fazer é uma referência a “questões que este país e região encaram”. Seria a ocupação tal questão?

O que pode ter de errado em dialogar?, alguém poderia perguntar. No entanto, a questão correta seria: “é moral colaborar com um Estado colonial, racista, militarizado, de forma a limpar seus crimes?” Não significa isto que os crimes continuam e que novos crimes serão perpetrados? De fato, as evidências claramente demonstram que “compromissos” continuados não levaram a nenhuma resolução, mas, ao contrário, serviram para adormecer a sensibilidade da academia internacional para as realidades da Palestina ocupada. No caso da África do Sul, era claro para todos os acadêmicos que não existia nenhuma maneira de “dialogar” com o apartheid falando com seus representantes; o único modo de lidar com o apartheid era se opondo a ele – boicotar, desinvestir e aplicar sanções; negar às instituições sul-africanas qualquer apoio ou diálogo; e seguir o conselho do CNA.[14]

Embora não ainda na mesma escala que a campanha sul-africana, a campanha BDS tem tido sucesso. Muitos acadêmicos pelo mundo estão agora sensibilizados demais para tornarem-se cúmplices da ocupação ilegal de Israel, suas políticas coloniais e suas práticas de apartheid e pararam de colaborar com instituições israelenses. A campanha para boicotar a conferência de história oral “internacional” da Universidade Hebraica é parte de um crescente esforço mundial para honrar o chamado palestino por um boicote acadêmico a Israel.

Porque tantos historiadores vêem seu trabalho como um modo de dar voz aos oprimidos e silenciados, boicotar essa conferência deveria ser óbvio. De fato, para os historiadores orais com mente aberta, trata-se somente disto, mesmo que muitos dos praticantes da História Oral nos Estados Unidos tenham enfiado basicamente suas cabeças na areia, seguindo a orientação de seu governo.

Nós imaginamos o que os dois advogados do compromisso, solicitados para a palestra, farão, e especialmente como a Universidade Hebraica responderá. Irá ela jogar fora, por exemplo, os dispêndios generosos aos participantes, lhes rendendo sua parte para a máquina de propaganda israelense? Nós esperamos, ao contrário, que os historiadores orais ao redor do mundo prestarão atenção ao chamado dos palestinos, honrando a fundação ética/moral básica do trabalho do historiador.



Notas

[1] Nakba, que em árabe significa “catástrofe”, é como ficou conhecido o grande êxodo palestino de 1948, quando mais de 700 mil palestinos, segundo dados da ONU, fugiram ou foram expulsos de seus lares. [N.T.]

[2] Dr. Sharon Kangisser Cohen, postado na lista de divulgação da Conferência, 05 de agosto de 2013. Disponível em: http://bit.ly/1PDm0XI.

[3] Yitzhak Shamir (1915-2012), do partido conservador Likud, foi primeiro-ministro duas vezes, entre 1983 e 1984 e entre 1986 e 1992. Ex-integrante do Lehi, grupo armado sionista que operava na Palestina entre 1940 e 1948, é considerado o mentor do assassinato do diplomata Folke Bernadotte, nomeado pela ONU para mediar o conflito entre árabes e israelenses na região em 1948. [N.T.]

[4] KELLER, U. “The Academic Boycott of Israel and the Complicity of Israeli Academic Institutions in Occupation of Palestinian Territories”. In. The Economy of the Occupation: A Socioeconomic Bulletin. Alternative Information Centre, 2009. Disponível em: http://bit.ly/23w9Muu.

[5] Ver SHEIZAF, Noam. “Stephen Hawking’s message to Israeli elites: the occupation has a price”. +972. 8 de maio de 2013. Disponível em: http://bit.ly/1KHUTJR.

[6] Cast Lead (Chumbo fundido) foi o nome dado pelas forças israelenses à ofensiva lançada na Faixa de Gaza em dezembro de 2008, que resultou na morte de pelo menos 1.387 palestinos, mais da metade civis, entre eles 320 crianças e 111 mulheres, segundo a ONG israelense B’Tselem. [N.T.]

[7] AURDIP – Association Universitaire pour le Respect du Droit International en Palestine.

[8] PABI – La Plataforma para el Boicot Académico a Israel; BAB – Berlin AB; InCACBI – Indian Campaign ACBI.

[9] Começada com a aprovação, em 9 de novembro de 2012, de uma moção de boicote acadêmico na união acadêmica TUI (Teachers Union of Ireland). Ver PACBI, “TUI Dublin Colleges Branch AGM passes motions in support of Boycott, Disenvestment and Sanctions; recognizes Israel’s apartheid nature”. 13 de novembro de 2012. Disponível em http://bit.ly/1UtnUOZ.

[10] Instituto de Tecnologia de Israel, sediado em Haifa. [N.T.]

[11] Ver RAVID, Barak. “Prime Miniter’s Office recruiting students to wage online hasbara battles”. Haaretz, 13 de agosto de 2013. Disponível em: http://bit.ly/; e ABUNIMAH, Ali. “Israel’s ‘pretty face’: how National Union of Israeli Students does government’s propaganda dirty work”. The Electronic Intifada. 05 de janeiro de 2012. Disponível em: http://bit.ly/1KdjZ8w.

[12] Professor de História da Universidade de Tel-Aviv. [N.T.]

[13] SAND, S. The Invention of the Land of Israel: From Holy Land to Homeland. Londres: Verso, 2012. p. 259-281.

[14] Congresso Nacional Africano. [N.T.]


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Matéria relacionada:





Deputado Jean Wyllys em sua recente visita à Israel para um “diálogo com a academia”


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